quinta-feira, 11 de março de 2010

STF deve propor 30 dias de férias para juiz, diz Peluso

Para novo presidente, defender benefício de 60 dias seria uma "batalha perdida"
Eleição de ministro, de estilo mais discreto e voltado para a corporação que Mendes, significa mudança de perfil da mais alta corte do país

FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A troca de comando do Supremo Tribunal Federal, a partir de 23 de abril, representará uma mudança de estilo. Sai Gilmar Mendes, cujo mandato foi marcado por polêmicas sobre vários temas da vida nacional, e entra Cezar Peluso, eleito ontem, de temperamento mais introspectivo e com atuação voltada a assuntos do Judiciário.

Peluso concedeu ontem à Folha uma rara entrevista. Disse que o STF deve propor a redução de 60 para 30 dias das férias dos juízes -apesar de, pessoalmente, defender a prerrogativa. "Politicamente para o Supremo não convém entrar em batalhas perdidas", disse.

A despeito de admitir o fim do privilégio, o pensamento de Peluso tende em geral para o lado conservador do espectro político. No que diz respeito à transparência, o ministro acha que o acesso a processos judiciais em formato digital, já presente em várias instâncias, deve ser facilitado apenas às partes envolvidas e à imprensa.

Mas Peluso não mantém posições imutáveis. Crítico no passado da TV Justiça, que transmite os julgamentos do STF ao vivo, hoje ele considera a ferramenta irreversível.
Sobre ineficiência do Judiciário, defende as posições da corporação: "Seria necessário dobrar o número de juízes".

Sua ideia mais audaciosa será tentar mudar o sistema de relacionamento entre os integrantes do STF. Fala sobre "experimentar troca de opiniões" para vencer a histórica cultura segregacionista da corte, pois os magistrados pouco interagem antes de um julgamento.

Leia trechos da entrevista:

 

POLÍTICA E JUSTIÇA
Acho que eles [políticos] têm de entender que isso [a judicialização da política] é uma coisa provocada de fora. Nós estamos parados. Eles é que trazem os problemas para nós. Nós temos de dar resposta. É o mau funcionamento do mundo político, ou um funcionamento não tão perfeito, que obriga as pessoas a ir ao Supremo.


INTERVENÇÃO NO DF
É um problema típico [de judicialização]. O procurador-geral recorreu ao Supremo. Por quê? Porque os políticos não estão conseguindo resolver a crise, que é grave. O Supremo terá de dizer alguma coisa.
A decisão, em março, acho que não dá. Mas no começo de abril o Supremo decide.


ESTILO NO STF
Depende de personalidade. O ministro Gilmar Mendes é mais extrovertido. Eu diria que tenho um espírito mais recatado. Não que seja mais virtuoso. Pelas minhas características pessoais, falarei menos.


RICOS X POBRES
[Por que existe a percepção de que ricos sempre se saem melhor na Justiça?] O rico pode contratar um advogado extremamente competente. O pobre tem de se contentar, quando há, com o advogado dativo [nomeado pelo poder público], que muitas vezes trabalha para empurrar os casos com a barriga.
A Constituição criou as defensorias públicas, mas os governadores não as criam. Quando criam, colocam lá meia dúzia de advogados que não dão conta de nada. O que nós podemos fazer para que um pobre tenha uma boa defesa? Nada. A função do presidente do CNJ é abrir a boca e dizer que as defensorias públicas são importantíssimas e não podem continuar como estão.


FÉRIAS DE 60 DIAS
Várias vezes tirei férias inteiras para trabalhar. Às vezes, trabalhava sábado e domingo para que não ficasse com muitos processos acumulados. É importante dizer isso porque é comum ouvir que é injusto o juiz ter 60 dias de férias.
Quando enviar o projeto de Lei Orgânica da Magistratura neste ano para o Congresso, não vou me desgastar para defender 60 dias de férias. Politicamente para o Supremo não convém entrar em batalhas perdidas. Possivelmente, no Supremo, a ideia das férias de 30 dias vá acabar prevalecendo.


NÚMERO DE JUÍZES
O número de juízes por habitante no Brasil é um dos mais baixos do mundo. Seria necessário, no mínimo, dobrar o número de juízes. Mas há número de pessoas preparadas para assumir esses cargos todos?


ACESSO DIGITAL
Acho que não é legítimo estar aberto para quem quer bisbilhotar. Quem não tem interesse direto não deveria ter acesso.


TV JUSTIÇA
Não tem quem tire a TV Justiça do ar. A opinião pública daria um pau dizendo que estamos querendo esconder algo.


DECISÕES NO STF
Acho que o STF tem que experimentar troca de opiniões. Fazer reuniões. Uma discussão prévia antes dos julgamentos. É mais fácil numa reunião prévia um concordar com o outro sem sentir que está capitulando. As decisões do STF não podem causar insegurança jurídica.

Fonte: Blog do Fernando Rodrigues

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