sábado, 29 de maio de 2010

"Venda" de férias por juízes e membros do MP

Alguns juízes federais reclamam que membros do Ministério Público podem "vender" suas férias. Ou seja, convertê-las em dinheiro. Assim como os juízes, os membros do MP têm dois meses de férias anuais. Porém, a "venda" de férias pelos magistrados está proibida pelo Conselho Nacional de Justiça.
Ficam as seguintes perguntas: a) Por que o Conselho Nacional do Ministério Público permite tal prática, se os próprios juízes não podem fazê-lo? b) Em que medida a "venda" de férias atenta contra a lógica do direito, ou seja, se o argumento é a necessidade de descansar dois meses, a venda não a deslegitimiza?

O Blog enviou essas duas questões, sugeridas por um juiz federal, ao Corregedor Nacional do Ministério Público, Sandro Neis, para esclarecer as dúvidas, e ao Procurador da República Celso Três, de Santa Catarina, para opinar a respeito.
Eis os esclarecimentos do Corregedor do MP:
"A possibilidade de venda de férias é regulamentada por lei. No caso dos juízes, pela Lei Orgânica da Magistratura, que é uma só para todo o Poder Judiciário. O Conselho Nacional de Justiça reafirmou o que está vedado pela lei. No caso dos membros do Ministério Púlico, essa regulamentação é feita pela Lei Complementar 75/93 para o Ministério Público da União e, nos termos constitucionais, por leis estaduais para o Ministério Público de cada unidade da Federação. Algumas dessas leis permitem a venda de parte das férias, outras não".

Eis os comentários do Procurador da República Celso Três:
"Categórico está que a venda integral das férias é contraditória com o lapso de 60 dias. No MPF, consoante explicitado na lei, há possibilidade da venda de 10 dias a cada 30, ou seja, 20 dos 60.

Nos Estados, MP's vendem até a integralidade das férias. Isso também acontece com o Judiciário.

Em última análise, embora sejam justificáveis os 60 dias de férias (efetivo gozo, não venda), a essência da disputa é remuneratória.

A reforma do Judiciário (Emenda constitucional 41/03), fixou teto remuneratório dos MP's e Judiciários Estaduais um pouco abiaxo dos órgãos federais.

O STF, invocando o genérico pacto/isonomia federativo, detonou, dizendo inconstitucional que os Estados fiassem aquém da União (ADI 3367/DF).

'Data venia', decisão essa voluntarista, assim como tantas desse atual STF (liquidação da lei de imprensa incluindo direito de resposta, liquidação da habilitação do jornalista ao ofício, verticalização das eleições etc.).

Desde sempre, os legislativos estaduais têm teto abaixo do Congresso Nacional e nunca disseram que isso quebra o pacto ...

A partir dessa decisão do STF, os órgãos federais, antes teto, passaram a ser piso, ou seja, os MP's e Judiciários dos Estados, no mínimo, devem ganhar igual ao federal. Porém, ganham mais, bem mais: auxílio-moradia a todos os membros (Estado de SC ao MP), venda integral de férias (Estado de SP etc.), pagamento de até 2/3 a mais da remuneração pelo acúmulo de ofícios de outros membros em licença/férias, pagamento de toda sorte de gratificações/funções (coordenador de centro de apoio operacional aos MPE's, chefias etc.)

Sabida a isonomia estatutária entre o Parquet  e Judiciário (art. 129, §4, da Constituição), o Egrégio STF já sacramentou a igualdade entre os Órgãos dos Estados e os da União, 'verbis'":

'Salientando-se o caráter nacional e unitário do Poder Judiciário, entendeu-se que as normas em questão, aparentemente, violam o princípio da isonomia (CF, art. 5º, caput e I) por estabelecerem, sem nenhuma razão lógico-jurídica que o justifique, tratamento discriminatório entre magistrados federais e estaduais que desempenham iguais funções e se submetem a um só estatuto de âmbito nacional (LC 35/79), restando ultrapassados, desse modo, pela EC 41/2003, os limites do poder constitucional reformador (CF, art. 60, § 4º, IV). Asseverou-se que o caráter nacional da estrutura judiciária está reafirmado na chamada regra de escalonamento vertical dos subsídios, de alcance nacional, e objeto do art. 93, V, da CF, que, ao dispor sobre a forma, a gradação e o limite para fixação dos subsídios dos magistrados não integrantes dos Tribunais Superiores, não faz distinção, nem permite que se faça, entre órgãos dos níveis federal e estadual, mas sim os reconhece como categorias da estrutura judiciária nacional ...'(ADI 3367/DF (DJU de 17.3.2006); ADI 2087 MC/AM (DJU de 19.9.2003). ADI 3854 MC/DF, rel. Min. Cezar Peluso.


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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Participação popular é deciciva na luta contras às drogas!

Juiz afirma ser a ajuda do povo o fator decisivo no combate às drogas em Cajazeiras
O juiz da 4ª Vara da Comarca de Cajazeiras, Edivan Rodrigues, disse nesta terça-feira (19), que a grande melhoria do combate às drogas em Cajazeiras se deve à população que tem feito sua parte.
Segundo Edivan Rodrigues, para que o combate de drogas seja eficaz, a população precisa de melhorias na educação, saúde, assistência social e criação de empregos e isso depende dos governos municipais, estaduais e federais.



Educação dos filhos
O Juiz de Cajazeiras acrescentou que é de inteira responsabilidade dos pais cuidarem da educação dos filhos, para que estes não caiam no mundo das drogas, e é verdade que os traficantes procuram aliciar a juventude, mas se esses jovens possuem um esclarecimento dos pais e da sociedade acerca dos malefícios da droga, não vão entrar neste mundo perigoso.
“Não é desculpa para os pais afirmarem que o motivo dos seus filhos estarem envolvidos com drogas, é por residirem em áreas pobres”, salientou.



Debate
As afirmações do juiz foram proferidas diante do debate que aconteceu na tarde e noite desta terça, na câmara municipal de Cajazeiras, onde o comitê de combate às drogas realizou um balanço das ações realizadas depois do primeiro encontro.
Os orgãos e lideranças da sociedade organizada de Cajazeiras estão empenhados na luta para abolir as drogas em nossa. Novas ações devem continuar acontecendo depois de mais um debate.

Fonte Diario do Sertão


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segunda-feira, 3 de maio de 2010

Entrevista com Bruno Dantas

O consultor do Senado, Bruno Dantas, que integra a comissão de 12 juristas encarregados de elaborar o anteprojeto do CPC, explica que o novo incidente “será muito mais amplo” do que os recursos repetitivos, porque “vai inibir as ações repetitivas” e não apenas os recursos. Em entrevista à Consultor Jurídico, Bruno Dantas informou que o incidente será decidido no TJ ou TRF, vinculando as decisões dos juízes de primeiro grau.
“Sempre que houver uma demanda com potencial de se multiplicar, o juiz vai suscitar o tribunal e este vai decidir a tese jurídica que os juízes de todo o estado ou região vão aplicar no caso concreto, naturalmente exercendo seu papel de analisar provas e demais atos processuais”, explicou. Segundo ele, para cada tipo de demanda haverá, no máximo, 27 recursos ao STF ou STJ, um de cada decisão estadual. E a decisão superior também vai gerar uma tese jurídica vinculante para todo o país.

A Comissão que elaborou o novo CPC vai continuar ativa, por decisão do presidente do Congresso Nacional, senador José Sarney (PMDB-AP). Os juristas vão acompanhar a tramitação do processo e auxiliar os parlamentares até a aprovação da lei que criará o novo CPC. De acordo com Bruno Dantas, ao estender o prazo de entrega do anteprojeto para o dia 8 de junho, o senador José Sarney reconheceu a importância da Comissão e acabou dando um prazo “importante para que os juristas façam uma boa revisão do texto, eliminando eventuais incompatibilidades, já que o trabalho foi exatamente sanar as incongruências de 36 anos de reformas das leis processuais”, disse.

Bruno Dantas, 32 anos é baiano de Salvador. Mestre e doutorando em Direito Processual Civil (PUC-SP), é consultor-geral do Senado desde 2007. É conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público e integra o Comitê de Gestão do II Pacto Republicano. Professor dos cursos de pós-graduação e extensão da PUC-SP, do Instituto Brasiliense de Direito Público e da Escola Superior da Advocacia do DF. Autor de diversos artigos científicos e do livro “Repercussão geral: perspectivas histórica, dogmática e de direito comparado – questões processuais”.

Leia a entrevista

ConJur — Quais novidades o senhor destaca no anteprojeto do CPC?
Bruno Dantas — Uma das novidades é a criação da parte geral, aquele livro do Código que tem aplicação em todos os demais. Hoje, o CPC tem um livro de processo de conhecimento, um de recursos e um de procedimentos especiais. Os artigos sobre honorários advocatícios estão no processo de conhecimento e daí surge a pergunta: tem honorários advocatícios em recurso, tem honorários advocatícios no cumprimento da sentença? O mesmo em relação à multa por litigância de má-fé. Há coisas que estão no processo de conhecimento e entende-se que são aplicáveis só a esse processo. A partir da constatação de que podemos facilitar a vida daqueles que vão a juízo discutir uma questão importante quanto ao direito material, vimos que precisamos dotar os operadores do direito de mecanismos claros para estabelecer os caminhos que terão de trilhar até a sentença de mérito. Essa percepção fez com que trouxéssemos, por exemplo, a tutela de urgência para dentro da parte geral, eliminando o livro de processo cautelar. E a partir da antecipação de tutela que está hoje no processo de conhecimento, trouxemos tudo para a parte geral e chamamos de tutela de urgência.

ConJur — Como funciona a tutela de urgência?
Bruno Dantas — Toda vez que a parte tiver uma situação de urgência, o juiz pode, para assegurar o resultado do processo ou mesmo para evitar que aquele que tem razão sofra muito com a demora do processo, conceder uma solução urgente. Esse foi um trabalho metódico, de analisar o Código inteiro, descobrir o que vale para todos os livros e puxar tudo para a parte geral.

ConJur — O CPC atual foi totalmente descartado nesse trabalho?
Bruno Dantas — Tivemos o cuidado de olhar o Código com uma percepção moderna e identificar o que não faz mais sentido ser disciplinado pelo CPC. Por exemplo: as ações possessórias estavam entre os procedimentos especiais. Elas faziam sentido antes de 1994, quando não era permitido ao juiz que concedesse liminares. Agora, por que uma antecipação de tutela, quando o juiz pode dar uma tutela de urgência em qualquer caso? Não faz mais sentido termos um procedimento de ações possessórias, então vamos eliminá-lo. Também identificamos procedimentos que hoje são feitos judicialmente e que poderiam ser feitos extrajudicialmente. As separações em cartório são exemplos recentes. A partir dessa experiência bem-sucedida, ampliamos a desjudicialização para a ação de substituição de título ao portador.

ConJur — Teremos, então, um novo Código?
Bruno Dantas — O nosso CPC não é ruim, mas precisa de uma grande reforma. Ele é de1973, quando as relações jurídicas eram travadas de outra maneira. Não existia a massificação de conflitos que existe hoje. De quebra, há um fato importantíssimo, que é o advento da Constituição de 1988, que trouxe valores e princípios importantes que o nosso CPC, obviamente, não incorporou. Raciocinamos que era necessário trazer o CPC para dentro da Constituição de 88, valorizando os direitos fundamentais, afirmando que o papel do processo civil é instrumentalizar a proteção de direitos e não um fim em si mesmo.

ConJur — O novo Código dará mais atenção à necessidade de rapidez nas decisões?
Bruno Dantas — Esse direito fundamental veio com a Emenda Constitucional 45, que é a razoável duração do processo. A partir daí, calculamos que não é adequado que o Código valorize exageradamente a segurança em detrimento da celeridade. O atual CPC prevê que a sentença de primeira instância tem efeito suspensivo. Isto é, o juiz dá a decisão e ela não vale nada até que o tribunal confirme. Isso é absolutamente desproporcional para os valores de hoje: celeridade e efetividade. Uma regra como a vigente contraria o sistema constitucional. A Constituição garante a todos, no processo administrativo e judicial, o devido processo legal e os recursos a ele inerentes. Veja, é a própria Constituição que assegura os recursos. Mas, isso significa que a parte pode ter direito a 10, 15 ou 20 recursos? Não parece razoável. Então, a nossa intenção foi, sem ferir a ampla defesa e o processo legal, assegurar uma tramitação mais rápida dos processos.

ConJur — Com isso, haverá uma mudança no perfil do Judiciário e, por consequência, dos seus atores?
Bruno Dantas — A Associação dos Magistrados Brasileiros apresentou sugestões de mudanças e destacou que o CPC precisa disciplinar relações de massa. Isso tem um significado muito profundo. Não podemos tratar individualmente de 100 mil casos idênticos. O Congresso Nacional tem dado respostas a isso, quando permitiu que Supremo e STJ criassem mecanismos de solução em massa de conflitos de massa. Só que o CPC ainda não olhou para os tribunais de segunda instância e para o juiz de primeiro grau. Essa é uma das nossas propostas, sem prejuízo do devido processo legal. Precisamos assegurar que os tribunais deem uma solução única em casos como o da assinatura básica. É uma causa que afeta todos os brasileiros com telefone fixo, cerca de 40 milhões de pessoas. Será razoável distribuir 40 milhões de ações, gerando milhões de recursos? Por que não resolver tudo lá na primeira instância? Não se trata de resolver cada caso de uma maneira massificada, mas de resolver a tese jurídica e determinar que os juízes de primeiro grau apliquem a tese.

ConJur — Trata-se da criação da figura da tese jurídica vinculante?
Bruno Dantas — Lembro sempre de uma frase do ministro Carlos Veloso, à época em que era presidente do Supremo. Enquanto defendia a Súmula Vinculante, disse que um juiz que decide contra uma decisão do Supremo é um mercador de ilusões, pois está vendendo ao jurisdicionado a esperança de gozar de um direito que ele não tem, pois o Supremo ou o STJ já disseram que ele não tem. Então, em qualquer circunstância, é um problema gravíssimo.

ConJur — O problema da morosidade se restringe à quantidade de recursos?
Bruno Dantas — Existe um estudo do CNJ que diz que o maior problema do Brasil são os prazos cartorários, porque há varas com 20 ou 30 mil processos em que se leva três meses para juntar uma petição. Em um processo é possível arguir até seis incidentes e para cada um que o juiz decide, cabe um recurso. O prazo cartorário, que poderia ser de um ano, vai até cinco anos. Assim, pensamos em simplificar ao máximo o processo em primeiro grau.

ConJur — A parte terá apenas uma oportunidade de recorrer, então?
Bruno Dantas — Essa é a consequência da mudança que estamos implementando. O sinal que estamos dando é que ao invés de recorrer a cada ato do juiz, a parte deixa para recorrer na sentença, se ela perder, porque pode ser que ganhe. Alguém pode argumentar que existe o risco do tribunal anular tudo, mas o percentual de casos em que o tribunal anula tudo é mínimo. Vale a pena correr esse risco em troca da desburocratização e da aceleração na tramitação na primeira instância. Não é possível que o juiz tenha de ficar decidindo sobre incidentes o tempo inteiro. A ideia é dar a máxima efetividade possível à primeira instância.

ConJur — E como será a apelação?
Bruno Dantas — Mudamos a regra de efeito suspensivo da apelação. Essa é outra medida que valoriza o juiz de primeiro grau. Hoje convivemos com uma situação absurda: se um juiz der uma sentença, a decisão não vale nada até que o tribunal julgue o recurso. Mas, se esse mesmo juiz, analisar um pedido de antecipação de tutela e der a mesma decisão, esse pedido poderá ser executado. Ou seja, uma sentença que deriva de um processo de cognição exauriente, com toda a produção de prova possível, não vale nada e a antecipação de tutela pode ser executada. Por isso, eliminamos o efeito suspensivo automático do recurso de apelação. Se houver recurso da sentença, quando o processo chegar ao tribunal, o relator vai dizer se a apelação faz sentido e, se entender necessário, atribuir efeito suspensivo à apelação. É como acontece no agravo, que não tem efeito suspensivo e só o relator pode dar esse efeito suspensivo.

ConJur — O agravo será mantido?
Bruno Dantas — É preciso esclarecer que não estamos acabando com o agravo, mas sim com o regime rígido de preclusões, e com isso ele se torna desnecessário. Mas mantivemos o agravo no caso de tutela de urgência e ampliamos a sua eficácia, porque concedemos à parte que agrava o direito de fazer sustentação oral no tribunal. Sabemos que uma coisa é o tribunal receber uma petição fria e outra é o advogado ir à tribuna fazer sustentação oral.

ConJur — Como ficou definido o incidente de coletivização?
Bruno Dantas — Optamos por não usar o nome incidente de coletivização. A Comissão entendeu que estava dando a impressão de que estávamos falando em ação coletiva, o que não é o caso. Decidimos que o nome será Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, que envolverá o tribunal local (TJ ou TRF), e se houver matéria constitucional ou infraconstitucional em jogo, envolverá o Supremo e o STJ. Esse incidente será uma espécie de preparação para o julgamento do RE ou do REsp. Em regra, estes recursos não têm efeito suspensivo e estamos confirmando essa posição, com exceção dos casos em que houver Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Não é possível que a decisão do Tribunal da Bahia, por exemplo, valha imediatamente quando ainda falta a decisão do STJ ou do STF. Depois que a matéria passar por um deles, a decisão se estenderá para o país inteiro.

ConJur — Na prática, como funciona o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas?
Bruno Dantas — Imagine que um juiz de Sergipe verifique que determinado assunto tem potencial de se multiplicar. Ele suscita o incidente para o Tribunal de Sergipe, onde o relator vai examinar se esse incidente é ou não admissível. Se o TJ admitir e concluir que é conveniente ter uma decisão única sobre o tema, o presidente da corte determina a suspensão de todos os processos que tramitam no estado, na jurisdição do TJ-SE, comunica ao CNJ, ao STJ ou STF, conforme a matéria seja constitucional ou infraconstitucional. Com a decisão do Tribunal de Justiça, a tese fica localizada no estado, mas cabe RE e REsp. Nestes recursos, a decisão vale para o país inteiro.

ConJur — O efeito não é o mesmo da Lei de Recursos Repetitivos?
Bruno Dantas — Vai ser muito mais amplo e vai inibir as ações repetitivas. Quando o presidente do tribunal, à vista da admissibilidade do incidente, manda suspender todas as ações que estão em curso no juízo de primeiro grau, não haverá recurso porque o processo estará parado. E quando a tese for fixada, o juiz tem de aplicar aquela tese. Contra essa sentença, caberá uma apelação, mas não agravos e embargos. Estamos dando a essa decisão uma força muito grande e cogitamos a possibilidade de dar a ela efeito vinculante, proibir o juiz de decidir em sentido contrário. Quando você permite que o juiz da primeira vara decida de uma forma e o da segunda decida de outra forma, o princípio constitucional da igualdade não está sendo cumprido, gerando uma sensação de descrédito do Judiciário. Esse princípio, ao lado do princípio da legalidade, autoriza a imposição do efeito vinculante. Então, o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas é o carro-chefe do novo Código.

ConJur — Para instituir esse novo mecanismo, não seria necessária uma Emenda Constitucional
Bruno Dantas — Ainda estamos discutindo, mas talvez seja só uma recomendação. Caso o juiz não cumpra, o STJ poderia determinar o cumprimento. A Súmula Vinculante veio por EC porque havia uma cultura de completa desvinculação. Depois disso, parece que a comunidade jurídica despertou para o real papel das cortes. Não é possível que a Constituição tenha criado cortes como o STF e o STJ para servir apenas como terceira instância. Então, a Súmula Vinculante veio por EC para inibir qualquer controvérsia. Mas de 2004 para cá houve um amadurecimento institucional do Brasil. Para mim, não há necessidade de uma EC para dizer que o juiz deve cumprir o que decide o STJ. A liberdade do juiz está na apreciação de prova, de concepção de tese. Se existe um tribunal cuja única função é assentar interpretação de uma norma federal, a sua decisão não pode ficar só no papel, tem de ter um efeito vinculante. Quando os juízes decidem de forma diferente, as duas partes se sentem injustiçadas e recorrem. Multiplicar isso por milhares de causa equivale ao afogamento do Judiciário. O juiz merecer ser prestigiado e ter a sua força reconhecida, mas, paralelamente, os tribunais precisam ter o seu papel constitucional respeitado.

ConJur — O incidente de demandas repetitivas é uma evolução, um substituto da Lei de Recursos Repetitivos ou vão coexistir?
Bruno Dantas — Se o novo mecanismo for um sucesso, como imaginamos que será, dificilmente vai chegar aos tribunais aquela avalanche de recursos iguais. Então, os repetitivos podem perder o sentido. Ao invés de o STJ julgar milhares de casos idênticos, como acontece hoje, irá julgar 27 — um de cada estado.

ConJur — E quanto ao sistema como um todo, o CPC traz alguma inovação?
Bruno Dantas — A nossa proposta é simplificar o sistema e isso vale também para os recursos. Nós temos hoje no Brasil uma jurisprudência defensiva dos tribunais superiores que é algo muito ruim para o cidadão e para quem milita na Justiça. Se um juiz de primeiro grau recebe uma causa para a qual ele é incompetente, a solução é simples: ele manda para o juiz competente. Se o STJ recebe um recurso em que ele não é competente, o ministro mata o recurso e não manda para quem é competente. Então, criamos uma regra para que STJ, STF, TST sejam obrigados a enviar para o tribunal competente. Vamos acabar com as armadilhas do sistema, o tornando mais simples e mais amigável para a sociedade.

ConJur — A Comissão está corrigindo só a comunicação entre os tribunais ou também eliminando formalidades como quando a parte perde só porque optou pelo recurso impróprio?
Bruno Dantas — Quando permitimos que o tribunal dispense requisito de admissibilidade, a rigor estamos autorizando o tribunal a decidir questões importantes para o país, mas aí não entra questão de interesse individual da parte. Essa é uma coisa que precisa mudar no Brasil: a função do STJ e do STF não é decidir se o aluguel da parte A é devido à parte B. A sua função é orientar as instâncias secundárias e o juiz. Não é possível que o STJ julgue 300 mil casos por ano. É irracional. A Suprema Corte americana julga 60 casos por ano. No Japão, na década de 90, os ministros da Suprema Corte se reuniram com o parlamento para dizer que não havia mais condições de funcionar porque estava assoberbada com 5 mil causas para analisar. Até três anos atrás, o STF (brasileiro) julgava 120 ou 130 mil casos e todo mundo achando normal. Havia um pacto de fingir que não se enxergava as coisas, o jurisdicionado fingia que o seu caso estava sendo julgado e a Suprema Corte fingia que estava julgando.

ConJur — Quais as mudanças do CPC em relação ao advogado?
Bruno Dantas — Estamos valorizando muito o seu papel, porque partimos da premissa que o advogado é um defensor do cidadão. Vamos impedir, por exemplo, casos em que o advogado trabalha anos a fio em uma causa de R$ 10 milhões e lá no final o juiz fixa os honorários em R$ 10 mil. A ideia é vincular os honorários ao proveito econômico que a parte tem, porque o advogado foi partícipe disso. Estamos criando também formas de estimular comportamentos socialmente desejáveis. Em matéria de processo, isso equivale dizer que se aquele que perde perceber que a tese que ele defende não vai obter sucesso no tribunal, se resigne e cumpra a decisão. Não vai ficar recorrendo indefinidamente porque o juro no Judiciário é menor do que no banco.

ConJur — Seria uma forma de evitar recursos protelatórios?
Bruno Dantas — Estamos inibindo as aventuras judiciais ampliando o leque de multas, o que também valoriza a sentença. Vamos criar a sucumbência recursal, porque não é possível que aquele que perdeu em primeiro grau interponha recurso sabendo que não será provido, apenas para adiar o cumprimento. A sucumbência recursal também servirá para quando o recurso for denegado. A parte que vence não vai pagar duas vezes, mas a parte que perde na primeira e perdeu na segunda vai pagar dobrado. A mensagem que devamos passar ao país é a de que não vale a pena optar por aventuras judiciais. Esse não pode ser o comportamento estratégico na hora de formular uma política empresarial. A regra é recorrer quando, de fato, se acredita que a decisão é injusta.

ConJur — Em relação ao Ministério Público, o que foi decidido?
Bruno Dantas — Há uma preocupação de todos os integrantes da Comissão, de que o papel do MP no processo civil tem de ser aperfeiçoado para trazer para o CPC as prerrogativas do MP na defesa dos interesses constitucionalmente reconhecidos, como a defesa da ordem democrática, dos direitos sociais, dos direitos individuais indisponíveis. Pessoalmente, fiz uma rodada de discussões com o CNMP, onde a maioria dos conselheiros é originária do MP, e também com o Conselho dos Procuradores Gerais, que é presidido pelo doutor Olímpio Souto Maior, procurador de Justiça do Paraná. A demanda fundamental do MP é que o CPC reconheça duas coisas: a primeira é esse papel de defesa dos interesses sociais, que o MP já vem fazendo, mas que o Código precisa consagrar; e em segundo lugar uma demanda absolutamente legítima, de que quando o MP atua como fiscal da lei não pode caber ao fiscalizado dizer quando o fiscalizador vai atuar. O CPC precisa reconhecer ao MP o direito de dizer quais são os casos em que ele vai fiscalizar. O MP precisa ser o senhor dessa decisão e não o fiscalizado. Estou esperançoso.

ConJur — O Código Civil ficou décadas tramitando e quando saiu, em 2002, já recebeu críticas de que já estava defasado. Há risco disso acontecer com o CPC? O Congresso Nacional tem algum tipo de comprometimento de dar vazão rápida a esse projeto?
Bruno Dantas — Sim, existe o comprometimento. Em primeiro lugar, essa Comissão foi instituída pelo presidente do Congresso Nacional. Já o Código Civil foi elaborado por uma comissão instituída pelo Ministério da Justiça, não foi um ato do Congresso Nacional. Há uma diferença enorme, pois o Congresso não tinha comprometimento com o texto enviado pelo Ministério da Justiça. A atual proposta veio de alguém que tem uma liderança nata, que é o presidente do Congresso. Se ele não tiver liderança para propor uma reforma, quem vai ter? O senador José Sarney, em matéria de legislação, sempre trouxe ideias de vanguarda. Durante o seu governo, ele aprovou propostas muito inovadoras e teve a percepção de que a Reforma do Judiciário, lá de 2004, precisava ser concluída, porque a reforma constitucional foi feita, mas a reforma infraconstitucional não.

ConJur — Esse compromisso ressoa na Câmara Federal?
Bruno Dantas — O presidente da Câmara, deputado Michel Temer, esteve na audiência que realizamos aqui em Brasília, junto com diversos deputados, e ele assumiu um compromisso público de assim que a matéria chegar na Câmara, colocará em votação.

ConJur — Mas a tramitação não é tão rápida assim, não?
Bruno Dantas — Veja que há algo muito diferente do que aconteceu com o Código Civil, que levou 20 anos para ser aprovado. Há a percepção clara de que a reforma do Judiciário precisa ser concluída. No caso do Código de Processo Penal é um pouco mais complicado, porque envolve discussões no bojo da magistratura, do MP, da polícia e matéria que envolve liberdade é sempre mais delicada. O CPC, que tem questões importantes também, olha para o mundo numa outra perspectiva, ele é indispensável para reduzir o risco Brasil, para que o investidor saiba que se um dado contrato não for honrado ele tem começo e tem fim no Judiciário. Toda a sociedade é interessada numa Justiça mais rápida. Durante muito tempo se disse, injustamente, que a Ordem dos Advogados do Brasil tem interesse num processo lento. Não é verdade.

ConJur — A OAB apóia o anteprojeto?
Bruno Dantas — A OAB foi das primeiras instituições a se pronunciar francamente a favor de um novo CPC que traga celeridade. O presidente Ophir Cavalcante está pessoalmente empenhado em modernizar a legislação processual civil, o secretário da OAB é membro da Comissão. Recebemos esse documento da AMB, que não tem uma crítica ao trabalho da Comissão, só sugestões pontuais. O que temos hoje é uma confluência de forças, união de esforços, para que a sociedade brasileira tenha um diploma legal moderno que esteja à altura do país que o Brasil deseja ser no século XXI. Todos falam que o Brasil pode ser uma das 5 maiores potências do mundo na próxima década e o arcabouço jurídico brasileiro precisa estar preparado para isso, o CPC é fundamental nesse sentido.

Fonte: Conjur

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