terça-feira, 30 de junho de 2009

AMB não quer que juiz explique motivos de suspeição

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) entrou no Supremo Tribunal Federal com Ação Direita de Inconstitucionalidade contra resolução do Conselho Nacional de Justiça que determina que juízes devem apresentar à Corregedoria do tribunal as razões que o levaram a se declarar impedido. Juízes de segunda instância devem se explicar com a Corregedoria do CNJ. Não podem mais generalizar com motivo de foro íntimo, como ocorre hoje.

O CNJ decidiu editar resolução sobre o assunto depois de fazer inspeções nos Tribunais de Justiça do país e descobrir que, em alguns casos, o juiz só declara suspeição para se livrar do processo. Amazonas e Bahia encabeçam a lista de estados com mais juízes e desembargadores que usam a manobra.

Na ação, ajuizada na noite da última sexta-feira (26/6) em conjunto com a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a AMB alega que a norma é inconstitucional por violar a independência do juiz.

“Suspender a eficácia da resolução, evitando, assim, que os magistrados sejam compelidos a comunicar às corregedorias dos tribunais e à corregedoria nacional os motivos íntimos das declarações de suspeição ou, o que é mais grave, que deixem de declarar a suspeição em razão do constrangimento imposto pela resolução”, pede a ação.

Na opinião das três associações, a resolução viola a independência dos juízes, princípio assegurado à categoria pela Constituição Federal. “A resolução viola, por exemplo, as garantias da imparcialidade e da independência do juiz e do devido processo legal, tanto sob a ótica do magistrado, que deseja realizar o seu ofício, como sob a ótica do jurisdicionado, que tem o direito de não ter sua causa julgada por magistrado que se considere suspeito para fazê-lo”.

Ainda de acordo com a entidade, a norma do CNJ desrespeita "o direito à privacidade e intimidade do magistrado e a isonomia de tratamento entre os magistrados, porque retrata discriminação injustificada entre magistrados de primeiro e segundo graus em comparação com os magistrados dos tribunais superiores, os quais não estão submetidos às mesmas obrigações”.

A resolução
A Resolução 82 foi regulamentada no dia 9 de junho e afirma que todos os juízes devem expor, em ofício reservado, as razões do ato às corregedorias ou outros órgãos indicados pelos tribunais. De acordo com o documento, um número alto de declarações de suspeição por motivo de foro íntimo foi identificado durante as inspeções feitas pelo CNJ nos estados.

De janeiro a maio deste ano, o número de declarações de suspeição nos tribunais estaduais do país chegou a 8.747. O número de ações em andamento nesta esfera do Judiciário brasileiro chega quase a 48,5 milhões, de acordo com dados do CNJ.

Fonte: Conjur

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Lei da Mordaça: abaixo-assinado


Os cidadãos brasileiros abaixo-assinados vem por meio deste solicitar aos deputados federais de todo o país que votem contra o Projeto de Lei n.º 265 de 2007 ("mordaça"), de autoria do deputado Paulo Maluf (PP-SP), que estabelece a condenação de autores de Ações Civis Públicas e Ações Populares quando o ajuizamento tiver "má fé", representar perseguição política ou intenção de promoção pessoal. Também pela proposta, a associação ou membro do Ministério Público responsável pela ação deverá pagar multa equivalente a dez vezes o valor das custas processuais mais os honorários advocatícios.

A motivação do Sr. Paulo Maluf, famoso no anedotário político nacional, é clara. Inibir a ação do Ministério Público contra a improbidade administrativa e a corrupção, intimidando os promotores e procuradores, e com isso de modo algum podemos concordar. O Ministério Público - federal e estaduais - têm sido peça fundamental na defesa da democracia e do combate à corrupção e à improbidade. Caso ocorram excessos por parte de alguns de seus membros já existem na legislação brasileira meios de punir esse tipo de situação.

Não será com tais artifícios que iremos colaborar com o fortalecimento dessas instituições e da democracia no país.

Apoiamos o Ministério Público, e a sua entidade representativa a CONAMP - Associação Nacional do Ministério Público, na sua luta contra o malfadado projeto de lei e por isso subscrevemos o presente abaixo-assinado.


Clique aqui para aderir

terça-feira, 16 de junho de 2009

STF permite que MP-SP volte a pagar por plantões

Os procuradores e promotores de Justiça de São Paulo poderão voltar a receber pagamentos extras por plantões judiciários e serviços extras aos fins de semana e feriados. As gratificações, que estavam suspensas desde janeiro, poderão ser pagas novamente a partir desta semana, depois que o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, concedeu uma liminar ao Ministério Público de São Paulo. A liminar e suspendeu decisão do Conselho Nacional do Ministério Público que proibia os pagamentos. Clique aqui para ler a liminar, concedida em Mandado de Segurança.

A decisão do CNMP saiu em janeiro, no julgamento do Procedimento de Controle Administrativo 0.00.000.000652/2008-18. Os conselheiros entenderam ser inconstitucional o artigo 195 da Lei Complementar estadual 734/93 e o Ato Normativo 40/94, editado pelo procurador-geral de Justiça paulista para regulamentar a lei. O artigo 195 especifica os serviços especiais que dariam direito às gratificações, como os plantões judiciários, as fiscalizações de concursos e as atuações em juizados especiais, por exemplo. Os pagamentos também se baseiam no artigo 181 da Lei Complementar, que prevê que os membros do MP recebam, além dos vencimentos mensais, “diárias” e “gratificação pelo exercício cumulativo de cargos ou funções”. As normas prevêm que, opcionalmente, os promotores e procuradores compensem dias trabalhados nos plantões folgando em dias de expediente normal.

Um recurso do MP-SP ao CNMP foi rejeitado, por maioria, em maio. O relator, conselheiro Cláudio Barros Silva, votou pela aceitação do recurso, sendo seguido pelos conselheiros Sandro Neis, Francisco Maurício, Diaulas Ribeiro e Raimundo Nonato, mas eles ficaram vencidos.

Segundo o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Fernando Grella Vieira, autor do pedido de Mandado de Segurança, a decisão resulta na obrigação de que os promotores e procuradores trabalhem de graça. Os plantões da Promotoria da Infância e da Juventude, assim como os das Promotorias de Justiça Criminal, são feitos aos sábados, domingos e feriados. O Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial faz plantões noturnos e os procuradores de Justiça trabalham nos plantões judiciários em segunda instância.

O MP paulista alegou que a decisão foi arbitrária e não permitiu que os promotores se defendessem. Para eles, o Conselho violou a autonomia dos MPs estaduais, prevista no artigo 128, parágrafo 5º, da Constituição Federal. No Mandado de Segurança pedido ao Supremo, os procuradores afirmam também que o CNMP usurpou competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal ao julgar a constitucionalidade da Lei Complementar.

Foi com base nessa argumentação que o ministro Marco Aurélio concedeu a liminar ao MP paulista. A medida suspende a decisão do CNMP até o julgamento final do pedido de Mandado de Segurança pelo STF. O ministro argumentou que o Conselho extrapolou suas atribuições ao considerar inválida uma regra prevista em lei estadual. Para ele, somente o Supremo pode fazer esse julgamento, conforme artigo 102, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal. “Embora o Conselho Nacional do Ministério Público não haja proclamado, no âmbito do controle concentrado, a inconstitucionalidade da Lei Complementar 734, veio, sem a observância da forma explícita, a afastá-la do cenário jurídico normativo”, disse o ministro na decisão.

MS 28.066-2

Fonte: Consultor Jurídico

A crise é do Senado, não é minha’, diz José Sarney

A reputação de um político corresponde à soma dos palavrões que ele inspira nas mesas dos botecos.

Alvo dos mais desairosos comentários, José Sarney subiu à tribuna. Falou muito. Mas o disse pouco, quase nada.

Tomado no seu conjunto, o discurso (íntegra aqui) rende, no máximo, material para um epitáfio. Uma lápide inspirada no Barão de Itararé:

“Aqui jaz um brasileiro que viveu às claras, aproveitando as gemas e sem desprezar as cascas”.

No exercício de sua terceira presidência, Sarney teria bons motivos para avocar para si a responsabilidade pela crise, um pedaço que fosse.

Acha, porém, que a encrenca não lhe diz respeito: “A crise do Senado não é minha, a crise é do Senado”.

Na sua primeira presidência, em 1995, Sarney nomeou para a diretoria-geral Agaciel Maia, a quem se atribui o mafioso mecanismo da administração secreta.

Sarney passou uma borracha no passado: “Nenhum desses atos são da minha gestão”. E tratou de converter os malfeitos em obra coletiva:

“Todos nós somos responsáveis. Nós aprovamos aqui os atos da Mesa. O Senado, no seu conjunto, aprovou”.

Nos 14 anos da era Agaciel, o Senado editou algo como mil atos administraivos secretos.

Sarney deu à afronta constitucional a parência de um erro menor: “Não sei o que é ato secreto...”

“...O que pode ter é irregularidade da entrada em rede ou não de atos de administração...”

“...Tudo em relação ao passado. Nada do nosso período. Não temos nada a ver com isso”.

Sob a sombra frondosa da copa proporcionada pelas folhas secretas caíram três frutos da árvore genealógica da família de Sarney.

Sem contar a nomeação de uma filha do amigo Silas Rondeau, foram pilhados um neto e duas sobrinhas do presidente. Sarney posou de injustiçado.

“É por isso que querem me julgar? Falta de respeito pelos homens públicos. Se temos erros, não devo deixar de ter erros. Mas esses constituem extrema injustiça”.

“É injustiça do país julgar dessa maneira um homem como eu, de vida austerta, de família bem compota [...]”.

Como um comandante de navio que se queixa do mar, Sarney reclamou da imprensa. Alvejou também empresários e corporações.

Disse que há “muita gente interessada em enfraquecer o Senado”. São “grupos econômicos, setores raicais da mídia, grupos corporativos radiciais”.

Açulou o instinto de sobrevivência dos colegas: “Nesse momento, devemos pensar no Senado. É nele que estou pensando”.

Embora já tenha em mãos o levantamento das malfeitorias secretas do Senado, Sarney não se dignou a submetê-lo ao melhor detergente: a luz do sol.

Adiou para segunda-feira a divulgação. Alegou que o primeiro-secretário Heráclito Fortes convalesce de uma cirurgia.

Com esse gesto, ganhou mais seis dias para organizar a desconversa que utiliza para lidar com a crise. Punições? Nada de concreto foi dito. Só generalidades.

O discurso de Sarney reforçou na cabeça do brasileiro que paga a conta a impressão de que o Senado de hoje não é coisa nossa. Tornou-se cosa nostra.

Escrito por Josias de Souza às 19h55


sábado, 13 de junho de 2009

Entrevista: Min. Gilmar Mendes(ISTO É)

Depois do polêmico bate-boca com o ministro Joaquim Barbosa em abril, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, recebeu o apoio de boa parte de seus colegas. Mas tem sido alvo de abaixo-assinados na internet e enfrenta protestos contra sua permanência à frente do STF, algo inédito na história do Judiciário. Na quarta-feira 3, ele foi vaiado por estudantes após audiência na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Em entrevista à ISTOÉ, Gilmar afirmou que ficou no meio de um tiroteio ideológico, desde o momento em que concedeu dois habeas-corpus ao banqueiro Daniel Dantas. "Evidente que é um movimento organizado. Muito provavelmente, até remunerado. Em geral, imprimem panfletos. Mas isso não me cabe questionar", diz. "No caso Daniel Dantas, como havia uma luta política e comercial, há interesses contrariados, obviamente." Para Gilmar, a maior exposição do STF torna as pessoas que o integram mais expostas, mais suscetíveis a eventuais ataques. Mas ressalta que a autoridade da mais alta corte do País "é inequívoca". Quanto à sugestão de Barbosa para que Gilmar "ouça mais as ruas", o presidente do STF rebate: "Isso serve para encobrir déficits intelectuais."

ISTOÉ - Existe um descompasso, hoje, entre a opinião pública e o Poder Judiciário? Seria o caso de ouvir as ruas?
Gilmar Mendes - O embate que surge nesse tipo de colocação é saber se no combate à impunidade nós deveríamos fazer concessões no que diz respeito à observância dos direitos e garantias individuais. Entendo que a questão não está à disposição do julgador. A Constituição não deixa esse espaço. Combate à impunidade? Sim. Combate ao crime organizado? Sim. Mas dentro dos paradigmas do Estado de Direito. Se formos consultar a chamada opinião pública, vamos ter que saber como se faz a consulta. É a minha opinião pública, é a sua opinião pública? É a opinião pública de que grupo? É a minha rua? É a sua rua? É a rua de quem? É o ibope do bar? Do Baixo Leblon?

ISTOÉ - O País caminharia, então, para um outro tipo de Justiça?
Gilmar - Exatamente, Justiça plebiscitária. Tenho a impressão de que essa discussão escamoteia, na verdade, déficits argumentativos e serve de álibi para fundamentar tudo. A Justiça nazista era assim. Decidia em nome do interesse do Reich, ou de interesses "mais elevados". Isso não tem nenhum cabimento.

ISTOÉ - Como o sr. vê as manifestações contra a sua presença no STF?
Gilmar - Evidente que é um movimento organizado. Muito provavelmente, até remunerado. Em geral, imprimem panfletos. Mas não me cabe questionar isso. Tenho inúmeras manifestações de apoio em todos os setores, nunca tive nenhuma dificuldade de andar pelas ruas.

"Tenho inúmeras manifestações de apoio, nunca tive nenhuma dificuldade de andar pelas ruas"

ISTOÉ - As pessoas parecem acreditar que podem influenciar o STF.
Gilmar - Isto é uma bobagem. O tribunal nunca seguiu esse tipo de toada. Quando, por exemplo, no início da ditadura, houve as violências mais marcantes contra governadores, foi o STF que deu liminar em habeas corpus. Nas fases por que passamos hoje, especialmente a partir de 2003, 2004, com a nova ênfase das ações policiais, foi aqui que as pessoas encontraram abrigo. Nas operações Anaconda, Navalha e outras, com ataques inclusive à magistratura, foi aqui que as pessoas encontraram salvaguarda. Mas no caso Daniel Dantas, como havia uma luta política e comercial, há interesses contrariados, obviamente.

ISTOÉ - As pressões surgiram em função do caso Daniel Dantas?
Gilmar - Com certeza. É fundamentalmente em função desse caso, que teve duas decisões liminares concedidas por mim, referendadas pelo plenário, por nove votos a um.

ISTOÉ - Os críticos dizem que o STF agiu como juiz de primeira instância.
Gilmar - Esta é outra lenda urbana. É uma mentira deslavada. O caso tinha passado por todas as instâncias, pelo juiz de primeiro grau, tinha passado pelo Tribunal Regional Federal, pelo STJ e estava aqui com o ministro Ayres Britto. Quanto ao segundo habeascorpus, o tribunal considerou que era descumprimento do primeiro.

ISTOÉ - A Constituição determina que se fique em liberdade até que o processo transite em julgado. Mas alguns casos geram clamor público e deixam uma sensação de impunidade.

Gilmar - No Brasil temos hoje cerca de 480 mil presos, dos quais um número elevado, talvez de 50% a 60%, é de presos provisórios e outros já com sentenças definitivas. É um índice elevadíssimo, se considerados os índices mundiais de população carcerária em relação ao número de habitantes. Não mostra uma Justiça leniente quanto às prisões. O tribunal admite, mesmo depois de uma sentença de primeiro, de segundo grau, que se determine a prisão, mas com os fundamentos da prisão preventiva, quer dizer, o risco de fugir e a preservação da ordem pública. Mas há que exigir a fundamentação para a prisão. Não pode ser automática.

ISTOÉ - Muita gente diz que o STF, em cento e tantos anos, nunca condenou um parlamentar. Gilmar - Não é verdade. No passado, vamos encontrar pessoas que foram condenadas ou absolvidas. Mas, especialmente após a Constituição de 1988, os processos estavam parados. Esses processos só retomaram o seu curso normal a partir de 2002, 2003. Então, esse discurso é falso. Estamos cheios de lenda urbana, porque estamos no meio de uma luta política em que, mesmo pessoas sem formação jurídica, às vezes de formação jurídica não suficiente, transformaram-se em lutadores.

ISTOÉ - Como assim?
Gilmar - São gladiadores da opinião pública. Repito: essa tese de a Justiça "ouvir as ruas" (defendida por seu desafeto, ministro Joaquim Barbosa) serve para encobrir déficits intelectuais. Eu posso assim justificar-me facilmente, não preciso saber a doutrina jurídica. Posso consultar o taxista.

ISTOÉ - Quando o sr. fala em luta política, parece que há duas visões no STF.
Gilmar - Não vou falar sobre isso.

ISTOÉ - Mas há, no STF, duas concepções diferentes do direito?
Gilmar - O resultado dos julgamentos do STF está espelhado nas suas decisões, nos acórdãos, isso é inequívoco. Agora, creio que o foro privilegiado, o foro por prerrogativas de função, como nós o chamamos, tem cumprido função importante, até mesmo no que concerne à governabilidade. Dentro do conceito de criminalização da atividade política, se não tivesse foro privilegiado, certamente o presidente Lula não passaria por uma cidade sem ter que depor ao Ministério Público ou à polícia. É isso que se quer?

ISTOÉ - Por que a opinião pública tem a sensação de impunidade?
Gilmar - Quanto ao modelo especialmente de defesa, temos uma sociedade com muitas desigualdades, em que a defesa é paga. E pessoas que dispõem de advogados têm melhores condições. As outras dependem de defensorias públicas. Até há pouco tempo uma boa parte dos Estados nem sequer tinha essas defensorias.

Nós temos nos engajado inclusive no sentido de estimularmos as defensorias públicas, a advocacia voluntária. Porém, se olharmos numa outra perspectiva, certamente o serviço de saúde das pessoas aquinhoadas é melhor do que o serviço de saúde das pessoas sem recursos. O que vale também para o serviço escolar. Sem dúvida, a maior parte da população presa é analfabeta e pobre.

ISTOÉ - O que o sr. sente quando visita os presídios e vê a maioria pobre e analfabeta?
Gilmar - Essa é uma realidade.

"Dentro do conceito de criminalização da atividade política, se não tivesse foro privilegiado, o presidente Lula não passaria por uma cidade sem ter que depor"

ISTOÉ - O sr. não se sente frustrado, sem condições de mudar essa realidade?
Gilmar - Esse não é um problema que me cabe resolver. Essa questão tem que ser resolvida pelas instâncias apropriadas. O que estamos fazendo, menos até como presidente do Supremo, mais como presidente do Conselho Nacional de Justiça, é a adequada revisão das penas impostas. É preciso saber se as pessoas estão cumprindo a pena devida. Nessa área, por exemplo, não tem ninguém para me dar lição. Sou eu que tenho liderado, via CNJ, o processo de mutirão carcerário em todo o País. Antes, ninguém tinha feito isto.

ISTOÉ - Quais as medidas do CNJ?
Gilmar - Estamos incentivando a instalação das varas de execução criminal virtuais, para que haja controle e não haja esse quadro vergonhoso de encontrarmos pessoas que já cumpriram a pena duas vezes. Estamos discutindo a prisão provisória, exigindo que o juiz faça verificação do tempo de prisão, a cada três meses.

ISTOÉ - Como presidente do CNJ, o sr. pediu a suspensão da construção da sede do TRF1. Estava muito cara?
Gilmar - Nós estamos arrostando todas estas questões, as obras, a contratação de servidores e o aumento de quadros. Abrimos uma caixa de Pandora. Estamos discutindo todos os temas com grande abertura e honestidade.

ISTOÉ - Qual o problema mais grave da Justiça brasileira?
Gilmar - Talvez o maior problema hoje seja de fato a morosidade, mas decorrente em grande parte do excesso de demanda. Nós falamos de números de processos extremamente elevados, cerca de 70 milhões de processos no ano passado. Isso significa praticamente um processo para cada três habitantes.

ISTOÉ - Mesmo assim, a Justiça está ficando mais célere?
Gilmar - Tenho a impressão que sim. É claro que nós temos muitos desafios. Na medida em que temos êxito no conhecimento, na expansão das nossas atividades, nós atraímos mais processos. Em alguns casos eu até usei a expressão: "a gente é tão exitoso em determinadas áreas que acaba produzindo fracasso".

É o que eu chamo de "fracasso do sucesso", como já aconteceu no Juizado Especial Federal, que começou com um número pequeno de causas e teve uma expansão brutal de causas exatamente porque as pessoas perceberam que ali se obtinha uma decisão mais rápida.

ISTOÉ - Quando deve ser o julgamento do ex-ministro Antônio Palocci?
Gilmar - Talvez no final deste mês ou no início do mês de agosto.

ISTOÉ - As polêmicas recentes que envolveram o STF não afetam a imagem da mais alta corte do País?
Gilmar - Tenho a impressão que não. É claro que a maior exposição do tribunal chama a atenção e torna o tribunal e também as pessoas que o integram mais expostas, mais suscetíveis a ataques. Então é natural que isso ocorra. Mas é notório que, se nós hoje olharmos a autoridade do tribunal, ela é inequívoca. E certamente o tribunal não tem uma classificação depreciativa, se tivermos em conta os demais poderes.

ISTOÉ - A ideia de alguns ministros de limitar a transmissão das sessões do STF pela televisão pode prosperar?
Gilmar - Não acredito. Sempre que há algum incidente, e já tivemos alguns, vem essa colocação. Não acredito que essa ideia venha a frutificar ou que tenha maioria no âmbito do tribunal. Na realidade, a TV Justiça é hoje um símbolo da própria transparência do STF, que vem inclusive sendo imitada.

ISTOÉ - O sr. acha que poderia haver um outro sistema para escolher os ministros do STF?
Gilmar - Sempre há possibilidade de aperfeiçoar modelos. Eu tenho a impressão de que esse modelo que praticamos parece ter consistência. Se for introduzido o mandato, por exemplo, nós teremos o problema da renovação contínua da corte. Se abrirmos para uma escolha pelas casas legislativas, haverá o risco da politização excessiva e até mesmo de partidarização. Se abrirmos para a participação de organizações corporativas, teremos o risco da sindicalização das escolhas. É preciso estar atento.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

STF - ativismo sem precedentes?

Por: Luiz Flávio Gomes

Concluído o julgamento do famoso caso Raposa-Serra do Sol (demarcação de terras indígenas em Roraima), mais uma vez entrou em pauta o tema do "ativismo judicial", visto que o ministro Menezes Direito sugeriu a imposição de 19 medidas para a implementação da demarcação contínua. De ativismo judicial já se falou também quando o Supremo Tribunal Federal (STF) impôs a fidelidade partidária, o direito de greve no serviço público, a proibição do nepotismo, o uso restrito das algemas, etc.
Judicialização não se confunde com ativismo judicial. A judicialização nada mais expressa que a possibilidade de acesso ao Poder Judiciário, que é permitido a todos contra qualquer tipo de lesão ou ameaça a um direito. Outra coisa bem distinta é o "ativismo judicial". Há várias espécies de ativismo judicial. Aqui destaco três delas: ativismo em favor dos direitos constitucionais, ativismo judicial legislativo e proativismo judicial.
No ativismo pró-direitos fundamentais, o juiz adota postura ativa em favor da concretização dos direitos e das garantias do cidadão. Atua por conta própria, proativamente. Exemplo: todas as vezes que o juiz ou o tribunal concede um habeas corpus de ofício ele atua por conta própria, em favor da liberdade individual. Esse ativismo é distinto da judicialização, porque nesta o juiz assume atitude passiva (ne procedat iudex ex officio).
O ativismo judicial foi mencionado pela primeira vez em 1947, pelo jornalista norte-americano Arthur Schlesinger, numa interessante reportagem sobre a Suprema Corte dos Estados Unidos. Para o jornalista, caracteriza-se ativismo judicial quando o juiz se considera no dever de interpretar a Constituição no sentido de garantir direitos que ela já prevê, como, por exemplo, direitos sociais ou econômicos.
Mas existe outro tipo de ativismo judicial - o ativismo judicial legislativo - que consiste em o juiz tangenciar a atividade legislativa para complementar o ordenamento jurídico, ou seja, para dar os contornos finais do Direito. O STF está fazendo disso uso constante nas suas súmulas vinculantes.
No ativismo judicial que complementa o Direito há uma espécie de intromissão do Judiciário na função legislativa. O juiz, nesse caso, revela (a palavra está sendo utilizada sem conotação religiosa) o Direito existente no ordenamento jurídico. Ele ativa o sentido e a extensão de um princípio, por exemplo. Do princípio democrático de que todo o poder emana do povo o Supremo Tribunal Federal extraiu a regra da fidelidade partidária, que impede o político de mudar de partido injustificadamente depois da eleição. Essa regra não estava expressamente prevista, mas latente, no ordenamento.
Uma terceira espécie de ativismo judicial ainda pode ser destacada. Neste caso, o juiz assume uma postura legiferante inovadora, ex novo, ou seja, aqui o Judiciário inova o ordenamento jurídico. Invade totalmente a função legislativa. Trata-se de um proativismo, visto que o juiz se antecipa ao legislador do futuro e cria, ele mesmo, uma nova regra, que não pode ser inferida de nenhuma outra fonte normativa existente. No proativismo, o juiz muda, por conta dele, o rumo do ordenamento.
O Judiciário brasileiro já fez isso várias vezes. Foi no século passado, especificamente na década de 60, que reconheceu pela primeira vez o direito de meação da concubina, depois inventou a prisão-albergue, etc.
Quais seriam as razões do ativismo judicial no Brasil? O professor Luís Roberto Barroso, de Direito Constitucional, invoca duas: a nova composição do STF, por ministros bastante preocupados com a concretização dos valores e princípios constitucionais, e a crise de funcionalidade do Poder Legislativo, que estimula tanto a emissão de medidas provisórias pelo Executivo como o ativismo ou o proativismo do Judiciário. Todo poder, quando não exercido ou quando não bem exercido, deixa vácuo e sempre existe alguém pronto para preencher esse espaço vazio por ele deixado.
Qual é o problema de todo ativismo judicial legislativo ou proativismo? Está no risco de o Poder Judiciário perder sua legitimidade democrática, que é indireta. Em que sentido? As decisões dos juízes são democráticas na medida em que seguem, nas decisões judiciais, aquilo que foi aprovado pelo legislador. Sempre que o Poder Judiciário inova o ordenamento jurídico, criando regras antes desconhecidas, invade a tarefa do Poder Legislativo, ou seja, intromete-se na função legislativa. Disso emerge um outro risco: o da aristocratização do Estado e do Direito, que, certamente, ninguém no século 21 está disposto a aceitar.
Há outros riscos: se os magistrados do STF, um dia, só por hipótese, se engajarem nas ondas involutivas do Estado de polícia, surge também a ameaça de "hitlerização do Direito" (direito nazista). Se conferirem primazia a uma determinada religião, em detrimento das regras jurídicas, há o risco da "fundamentalização do Direito" (direito fundamentalista). Se não observarem nenhuma regra vigente no momento das decisões, pode-se chegar à "alternativização do Direito" (direito alternativo). O Direito construído pelo STF, de outro lado, pode resultar absurdamente "antigarantista" - aliás, essa é a censura que muitos já estão fazendo em relação à Súmula Vinculante nº 5, que dispensa a presença de advogado nos processos disciplinares.
O que podem fazer os magistrados do STF para evitar os riscos inerentes ao ativismo judicial? Mais cultura constitucional, mais filosofia jurídica e, acima de tudo, vigilância permanente no seu "autocontrole". O self-restaint deve conduzir tais juízes à ponderação, ao equilíbrio e à reflexão.

*Luiz Flávio Gomes , doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri, mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo, professor e diretor-presidente da Rede de Ensino LFG, foi promotor de Justiça (1980-1983), juiz de Direito (1983-1998)
e advogado (1999-2001)


Fonte: Estado de São Paulo 30/05/09

quarta-feira, 10 de junho de 2009

CNJ aprova medida que afasta os titulares de 5.000 cartórios

Resolução atinge não concursados e determina seleções públicas a partir de 90 dias

Tabeliães ficam nos cargos até que seleção seja feita; resolução pode perder efeito caso a Câmara aprove PEC que anistia não concursados

FLÁVIO FERREIRA
ANA FLOR
DA REPORTAGEM da Folha de S. Paulo

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou ontem por unanimidade uma resolução que determina a remoção dos titulares de cartórios civis do país que não passaram por concursos públicos para o preenchimento dos cargos.
A estimativa do CNJ é que mais de 5.000 tabeliães e oficiais registradores -cerca de um quarto do total do país- percam os postos com a medida, que vale para os que assumiram sem concurso após a promulgação da Carta de 1988.
A resolução também prevê a realização de seleções públicas para os cargos a partir de 90 dias. A expectativa do CNJ é a de que todos os novos concursos sejam concluídos até o final deste ano.
A decisão, entretanto, poderá perder efeito caso a Câmara aprove a PEC (proposta de emenda à Constituição) 471, que efetiva titulares de cartórios não concursados que já estejam há mais de cinco anos no cargo. A PEC está pronta para ser votada no plenário da Casa.
A atividade dos cartórios tem natureza privada e é realizada por meio de delegação do poder público. Os cartórios têm faturamentos que vão de R$ 500 a R$ 2,2 milhões por mês.
A medida aprovada ontem tem caráter obrigatório porque o CNJ é a instituição responsável pelo controle administrativo e disciplinar do Judiciário.
A resolução determina que os atuais titulares dos cartórios de registro civil, de imóveis, de notas e de protesto continuem nos postos em situação "precária" e "interinamente" até a realização dos novos concursos para os cargos.
A proposta inicial da resolução previa que os titulares seriam imediatamente afastados após a publicação da medida, e os cargos seriam ocupados provisoriamente pelos funcionários mais antigos dos cartórios. Porém, a ideia foi afastada na noite de ontem, porque havia risco de ser considerada ilegal.
O texto da resolução foi elaborado pela equipe da corregedoria do CNJ, presidida pelo ministro Gilson Dipp. Nos últimos anos, o grupo realizou inspeções em vários Estados e constatou várias formas de descumprimento ao artigo 236 da Constituição, que prevê que "o ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos".

Concurso
Por meio de outra resolução, o CNJ estabeleceu diretrizes para a uniformização dos concursos para os titulares dos cartórios. Uma das mudanças é a instituição da obrigatoriedade de provas objetivas com exames orais, práticos e de títulos. Muitos Estados não realizavam a prova oral.
A Associação dos Notários e Registradores do Brasil não quis se manifestar ontem. Recentemente, a entidade havia se posicionado a favor do concurso, mas pedia uma intervenção do Estado para não desamparar aqueles que se dedicaram por anos à atividade -não concursados que, com a decisão do CNJ, perderão o direito à delegação do cartório.
Outra entidade da área, o Irib (Instituto de Registro Imobiliário do Brasil), decidiu não se manifestar publicamente antes de analisar em detalhe a decisão do CNJ.
Procurado pela Folha, o instituto divulgou nota informando apenas que "entende que o ingresso em cartórios de registro de imóveis por meio de concurso público é uma forma democrática de as pessoas terem acesso ao exercício da atividade registral".

Marido e mulher podem ser juízes na mesma comarca

Orientações administrativas não se sobrepõem à Lei Orgânica da Magistratura (Loman). Com esse entendimento, o Conselho Nacional de Justiça cassou a determinação do Tribunal de Justiça de São Paulo que designou a juíza Daniela Mie Murata Barrichello para trabalhar na comarca de Americana, cidade do interior paulista.
Promovida para uma das varas de família de Limeira, a juíza foi impedida de assumir e trabalhar na cidade por conta da orientação do Conselho Superior da Magistratura paulista, de que juízes marido e mulher não devem trabalhar na mesma comarca. O marido de Daniela, juiz Luiz Augusto Barrichello Neto, é titular de uma vara criminal em Limeira.
A proibição do Judiciário paulista foi derrubada pelo CNJ nesta terça-feira (9/6). De acordo com o relator do processo, conselheiro José Adônis, a designação da juíza para outra comarca fere a garantia da inamovibilidade prevista pela Loman e tem caráter de sanção imposta sem o devido processo legal. Adônis determinou a desconstituição do ato do TJ-SP que designou a juíza para Americana e que a direção do Judiciário paulista se abstenha de trocar a juíza de lugar novamente.
A decisão do CNJ foi unânime. O pedido em favor da juíza foi feito por juízes, promotores e entidades da magistratura. Entre elas, a Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) e a Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis). O presidente da Apamagis, Nelson Calandra, esteve presente à sessão. A entidade foi representada pelo advogado Pierpaolo Cruz Bottini.
Promovida pelo critério de antiguidade em julho do ano passado, Daniela não foi lotada em Limeira. Segundo o tribunal, a orientação de manter juízes marido e mulher separados é resultado de experiências negativas pelas quais a Justiça paulista já passou. O TJ paulista sustentou que a juíza aceitou a recomendação e concordou em trabalhar como designada nas comarcas de Piracicaba, Rio Claro ou Americana, sem o recebimento de diárias.
A promoção da juíza, na verdade, seria condicionada ao compromisso de que ela não atuaria em Limeira. De acordo com o conselheiro José Adônis, o compromisso da juíza não pode ser tratado como renúncia à inamovibilidade. Adônis afirmou que a regra da Justiça de São Paulo é incompatível com o sistema legal e fere o princípio da unidade familiar.
A divergência entre as posições do CNJ e do TJ paulista nesse caso vem se somar ao confronto das duas instituições por causa do pagamento do chamado auxilio-voto feito pelo tribunal a alguns juízes. Nessa outra frente de conflito, o CNJ chegou a abrir um processo de reclamação disciplinar contra o presidente da corte paulista, por retardar a entrega de informações pedidas pelo conselho.

PCA 2009.10.00.001684-4

Fonte: Consultor Jurídico

segunda-feira, 8 de junho de 2009

TJPB pretende aprovar nova Lei de Organização Judiciária do Estado até setembro


Juiz-auxiliar da Presidência do TJPB, Alexandre Targino


O Tribunal de Justiça da Paraíba pretende, até setembro, dispor de uma nova Lei de Organização Judiciária do Estado (LOJE), já aprovada pela Assembleia Legislativa, adequada à nova realidade do Judiciário brasileiro, às resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e às mudanças ocorridas na legislação do País.

Para isso, a Comissão da LOJE, formada pelo presidente do TJPB, Luiz Silvio Ramalho Júnior, e pelos desembargadores Antônio Carlos Coêlho da Franca e Saulo Henriques de Sá e Benevides, tem trabalhado no novo projeto, com o apoio de magistrados e servidores.

Por designação do desembargador-presidente Ramalho Júnior, uma Subcomissão foi formada pelos juízes Alexandre Targino, Sérgio Moura Martins, Fábio Araújo e Ramonilson Alves Gomes, secretariados por Falbo de Abrantes Vieira (Secretário Administrativo) e Ana Dolores. Os trabalhos da Subcomissão foram iniciados em março deste ano.

De acordo com o juiz-auxiliar da Presidência do TJPB, Alexandre Targino, a Subcomissão fez um levantamento do número de processos ativos e distribuídos nos últimos dois anos nas unidades judiciárias de todo o Estado, bem como da competência de cada uma e composição quanto a juízes e servidores.

“Constatamos que há um desequilíbrio entre o número de processos distribuídos por unidades judiciárias, umas em relação às outras. Existe, por exemplo, numa certa comarca, uma vara com 300 processos e outra com 3 mil, em números aproximados, em decorrência de distorções de competência, provocando uma sobrecarga de um juiz em comparação com outro. Essa situação foi constatada levando-se em consideração apenas o número de feitos distribuídos”, disse o magistrado.

Alexandre Targino destaca que o estudo resultou na possibilidade de correção de competência; de propor, quando for estritamente necessária, a criação de unidades judiciárias e, também, a lotação ideal de servidores; a reorganização dos termos das comarcas; e o agrupamento de comarcas em circunscrição.

O término do trabalho da Subcomissão da LOJE, segundo o juiz, está previsto para o dia 17 deste mês, quando o documento com as sugestões será entregue à Comissão da LOJE.

“A partir daí, a Comissão vai apreciar as propostas e decidir se as aprova. Em caso positivo, o texto será colocado para consulta pública, por um determinado prazo. Ao fim deste período, serão analisadas as sugestões oferecidas, e aí o projeto será submetido à apreciação do Tribunal Pleno para aprovação”, explicou o juiz-auxiliar da Presidência do TJPB.

O passo seguinte será o envio do projeto à Assembleia Legislativa para tornar-se lei. “A expectativa nossa, e também do próprio presidente do TJ, que já afirmou isso, é de que essa lei seja aprovada, se possível, em agosto ou até setembro”, afirma Alexandre Targino.

O juiz destaca que “a LOJE atual precisava não apenas de uma modificação, mas de ser substituída mesmo, atualizada num todo, para acompanhar as mudanças que ocorreram após a adoção da Emenda nº 45; assim como as resoluções do CNJ e da Enfam (Escola Nacional d-- e Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados) do STJ; com a compatibilização de alguns institutos; e ao que hoje se pratica no Brasil”.

“Tudo foi revisto, com a finalidade de modernizar e simplificar o texto da Lei de Organização Judiciária do Estado, até para facilitar o manuseio. É claro que vamos precisar da ajuda dos magistrados e servidores, para aperfeiçoarmos ainda mais o projeto”, disse Alexandre Targino.

Fonte: TJ/PB
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Para corregedor, audiências públicas não expõem juízes

Entrevista do Min. Gilson Dipp para a Folha de São Paulo:

FOLHA - Qual foi o critério para a escolha da força-tarefa do CNJ?
GILSON DIPP - Fiz inicialmente uma seleção de juízes que já conhecia. Usamos juízes auxiliares da presidência. São juízes federais e estaduais, além de servidores que vieram do meu gabinete do STJ, emprestados ao CNJ. Os mutirões carcerários são feitos com juízes da presidência e juízes da corregedoria. Há uma integração.

FOLHA - Entre os mais próximos, estão dois juízes que atuaram no combate ao crime organizado.
DIPP - A esses juízes [Baltazar e Sanchotene] eu dei posse no Tribunal Regional Federal da 4ª Região. São pessoas em que tenho extrema confiança. Estão fazendo um trabalho técnico. As inspeções são calcadas em dados estatísticos sobre atrasos, congestionamentos.

FOLHA - Qual Estado o surpreendeu pelo grau de irregularidades?
DIPP - Cada um tem a sua peculiaridade. Talvez, no primeiro momento, a Bahia. Depois, nós vimos que não era o pior. Temos o Maranhão, o Piauí, com deficiências orçamentárias, com má aplicação dos parcos recursos orçamentários. Há excesso de servidores em cargos de confiança nos tribunais e poucos servidores destinados ao juiz de primeiro grau

FOLHA - E quanto às irregularidades mais graves?
DIPP - Não é a primeira prioridade, mas aparecem os casos de nepotismo cruzado, pagamentos acima do teto, casos de infração disciplinar.

FOLHA - Como o do Amazonas...
DIPP - Sim. Pela primeira vez o CNJ afastou um corregedor no exercício da função. Mas as inspeções não são para esse fim. Têm uma conotação muito mais abrangente: gestão, eficácia, celeridade. Gente que permanece na titularidade dos cartórios sem concurso.

FOLHA - A Associação Nacional dos Magistrados Estaduais reclama que a audiência pública expõe os juízes e fere a Lei Orgânica da Magistratura Nacional.
DIPP - A audiência pública é o instrumento mais democrático de participação do cidadão com o Judiciário. Elas são acompanhadas pela Associação dos Magistrados Brasileiros, pela OAB, pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, e por algumas pessoas do povo, que fazem suas manifestações.
Mesmo com um controle absoluto, sempre vai haver um excesso daquele que se sente desamparado. Mas audiência pública não serve ao contraditório. Se alguém se sentiu ofendido, tome as medidas cabíveis.

Fonte: FSP

Foha S. Paulo: "Intocáveis" comandam inspeções do CNJ

Equipe de corregedor nacional de Justiça, Gilson Dipp, é formada por quatro juízes-auxiliares e tem apoio de Gilmar Mendes

Procedimento adotado por conselho durante inspeções em tribunais estaduais é alvo de crítica de entidade, que vê "execração pública"

Alan Marques - 19.fev.09/Folha Imagem

O presidente do STF, Gilmar Mendes, e o corregedor nacional de Justiça, Gilson Dipp, no CNJ

O corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça, defende que o CNJ está passando o Judiciário a limpo com as inspeções realizadas em tribunais estaduais, apesar de protesto da entidade que representa os magistrados contra essas audiências públicas, sob a alegação de que expõem juízes à execração pública.
Com uma equipe de apenas quatro juízes-auxiliares -conhecidos no Conselho Nacional de Justiça como "Os Intocáveis"- Dipp conta com o apoio do ministro Gilmar Mendes, presidente do CNJ e do STF (Supremo Tribunal Federal).
O CNJ já realizou inspeções em Minas (Justiça Federal), Bahia, Piauí, Amazonas, Pará, Maranhão, Alagoas, Paraíba, Espírito Santo e Rio Grande do Sul (Tribunal Militar).
O órgão realiza audiências públicas nos Estados, com a presença de representantes da Associação dos Magistrados Brasileiros, membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e da Ordem dos Advogados do Brasil. Pessoas se inscrevem para fazer queixas e denúncias sobre a Justiça local.
Para formar a força-tarefa, Dipp requisitou inicialmente dois magistrados de sua confiança e com perfil semelhante ao seu (do RS e experientes em julgar crimes financeiros e de lavagem de dinheiro): José Paulo Baltazar Júnior e Salise Monteiro Sanchotene, de varas criminais de Porto Alegre.
Em 2006, na gestão da ministra Ellen Gracie na presidência do CNJ, Baltazar participou de comissão que apresentou proposta para regulamentar a situação dos presos provisórios.
Sanchotene tem experiência na área de direito penal. Teve atuação destacada nos trabalhos da Encla (Estratégia Nacional de Combate ao Crime de Lavagem). Ficou à disposição de Joaquim Barbosa, no STF, na elaboração do voto que recebeu a denúncia do mensalão.
A esse grupo juntou-se Ricardo Chimenti, juiz de direito em São Paulo, e o juiz Friedmann Anderson Wendpap, da 1ª Vara Federal de Curitiba, mestre em direito internacional.

Críticas
Em ofício enviado ao corregedor, a Anamages (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais) faz críticas aos procedimentos utilizados pelo CNJ.
"Nas audiências públicas realizadas por esse conselho, tem sido rotina aceitar reclamações contra autoridades judiciárias em público, de viva voz, expondo à execração pública desembargadores e juízes, tudo a depor contra a própria imagem do Poder Judiciário", afirma o desembargador Elpídio Donizetti, presidente da Anamages, no ofício.
Segundo Gilmar Mendes, porém, "alguns presidentes de tribunais do Sul têm pedido que realizemos inspeções e audiências públicas". Ele afirma que o CNJ mudou o foco: a corregedoria faz as inspeções, são fixadas as orientações e o conselho procura levar assistência técnica para ajudar os tribunais.
A partir das inspeções, o CNJ abriu processos disciplinares, identificou casos de corrupção e de nepotismo. Pela primeira vez, afastou um corregedor de Justiça (no Amazonas).
Para a Anamages, as reclamações contra magistrados deveriam ser formuladas por escrito e submetidas a sigilo. Pede ainda que o CNJ deixe de noticiar a instauração de procedimentos disciplinares contra juízes, citando nomes.

Fonte: FSP

domingo, 7 de junho de 2009

Lula sanciona lei que obriga divulgação de gastos públicos na internet

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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI COMPLEMENTAR Nº 131, DE 27 DE MAIO DE 2009

Acrescenta dispositivos à Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências, a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei Complementar:

Art. 1o O art. 48 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 48. ...................................................................................

Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante:

I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;

II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público;

III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A.” (NR)

Art. 2o A Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 48-A, 73-A, 73-B e 73-C:

Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a:

I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado;

II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários.”

Art. 73-A. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal de Contas e ao órgão competente do Ministério Público o descumprimento das prescrições estabelecidas nesta Lei Complementar.”

Art. 73-B. Ficam estabelecidos os seguintes prazos para o cumprimento das determinações dispostas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 48 e do art. 48-A:

I – 1 (um) ano para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios com mais de 100.000 (cem mil) habitantes;

II – 2 (dois) anos para os Municípios que tenham entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes;

III – 4 (quatro) anos para os Municípios que tenham até 50.000 (cinquenta mil) habitantes.

Parágrafo único. Os prazos estabelecidos neste artigo serão contados a partir da data de publicação da lei complementar que introduziu os dispositivos referidos no caput deste artigo.”

Art. 73-C. O não atendimento, até o encerramento dos prazos previstos no art. 73-B, das determinações contidas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 48 e no art. 48-A sujeita o ente à sanção prevista no inciso I do § 3o do art. 23.”

Art. 3o Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 27 de maio de 2009; 188o da Independência e 121o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
Guido Mantega
Paulo Bernardo Silva
Luiz Augusto Fraga Navarro de Britto Filho

Este texto não substitui o publicado no DOU de 28.5.2009

Lei no. 11.942/09 - assegura às mães presas e aos recém-nascidos condições mínimas de assistência

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.942, DE 28 DE MAIO DE 2009.

Dá nova redação aos arts. 14, 83 e 89 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, para assegurar às mães presas e aos recém-nascidos condições mínimas de assistência.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o O art. 14 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte § 3o:

“Art. 14........................................... ........... ...........

...............................................................................

§ 3o Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.” (NR)

Art. 2o O § 2o do art. 83 e o art. 89 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 83............................................ ........... ...........

...............................................................................

§ 2o Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade.” (NR)

“Art. 89. Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa.

Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche referidas neste artigo:

I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas; e

II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável.” (NR)

Art. 3o Para o cumprimento do que dispõe esta Lei, deverão ser observadas as normas de finanças públicas aplicáveis.

Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 28 de maio de 2009; 188o da Independência e 121o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto
José Gomes Temporão

Este texto não substitui o publicado no DOU de 29.5.2009

sábado, 6 de junho de 2009

Cachimbo da paz: TJ-SP reconhece falha e oferece colaboração ao CNJ

O presidente do Judiciário paulista, Vallim Bellocchi, disse nesta sexta-feira (5/6) que o conservadorismo e o tamanho do Tribunal de Justiça de São Paulo colaboraram na demora para atender pedido do Conselho Nacional de Justiça. Na semana passada, o CNJ mandou instaurar processo administrativo disciplinar contra Bellocchi por este ter negado informações sobre o pagamento da diferença de entrância, o chamado auxílio-voto, aos juízes que atuam no segundo grau.
Bellocchi aproveitou o lançamento da sexta edição do Prêmio Innovare, nesta sexta-feira (5/6) em São Paulo, para lançar afagos na direção do CNJ e apagar a sucessão de incêndios provocados pelo julgamento e, depois, pela manifestação de desagrado na sessão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça. Bellocchi ganhou a compreensão do ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ. Para o ministro, o incidente da semana passada não afetou as relações institucionais.
“O Tribunal de Justiça de São Paulo é muito grande e conservador e nem sempre consegue ser ágil”, reconheceu Bellocchi, numa referência ao episódio em que o CNJ requisitou informações sobre o pagamento de magistrados. “Mas o tribunal é parceiro e está pronto a colaborar”, completou.
“O tribunal já prestou as informações e o episódio está superado”, disse o ministro Gilmar Mendes. Ele confirmou que se encontrou em Brasília com Bellocchi e mais três desembargadores paulistas para tratar do assunto. No encontro, os representantes do TJ de São Paulo entregaram as informações requisitadas pelo Conselho.
“Na verdade não é auxílio-voto. É uma suplementação paga aos juízes, uma diferença de entrância”, explicou Gilmar Mendes. Segundo ele, o TJ paulista alegou dificuldades na coleta de dados e esta seria a explicação na demora das informações chegarem até o CNJ.
O incêndio



O caso julgado pelo CNJ trata de representação formulada pelo juiz Adugar Quirino do Nascimento. O magistrado alega que está havendo tratamento desigual entre magistrados paulistas, depois que o Tribunal resolveu reestruturar a carreira. Segundo ele, a mudança beneficiou alguns juízes que foram promovidos sem mudança de comarca, tendo direito ao que chamou de auxílio-voto.

O CNJ pediu para o Tribunal explicar como funcionava o pagamento aos magistrados e qual a base de sua legalidade, dentro do teto constitucional dos subsídios. As informações foram requisitadas várias vezes e, segundo o conselheiro Joaquim Falcão, o tribunal não respondeu e enviou respostas incompletas.

Diante da atitude adotada pela direção do Tribunal paulista, o relator Joaquim Falcão decidiu levar o caso a julgamento. O CNJ decidiu pela instauração da reclamação disciplinar contra o presidente Vallim Bellocchi e mandou suspender o pagamento das diferenças até o julgamento do mérito.

Diplomacia

O julgamento não agradou os desembargadores paulistas, que durante sessão do Órgão Especial fizeram uma manifestação de desagravo a favor do presidente. O ataque mais duro partiu de Vallim Bellcchi: “Não me ajoelho porque vejo o julgamento como prematuro, despreparado”, disse o presidente na ocasião.
A reação veio no dia seguinte. O conselheiro Joaquim Falcão deu prazo de 48 para o Tribunal mandar ao CNJ a ata e a degravação do áudio da sessão. O TJ não mandou e, na quarta-feira, Falcão pediu ao ministro Gilmar Mendes providências para que a determinação fosse cumprida.
O Tribunal resolveu mudar de estratégia e decidiu mandar uma representação oficial, composta por quatro desembargadores, incluindo Bellocchi, para conversar diretamente com os ministros Gilmar Mendes e Gilson Dipp, corregedor–geral de Justiça do CNJ.
O objetivo dos conciliadores era levar a questão para a área diplomática e desarmar os incendiários. Entregaram um documento de quase mil páginas com a planilha desdobrada, mês a mês, com os valores depositados na conta de cada magistrado que recebeu a diferença de entrância. A nova estratégia parece ter dado certo. É o que se depreende dos discursos desta sexta-feira.
Fonte: Consultor Jurídico

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Juízes trabalham mais, mas processos se acumulam

A Justiça Estadual está trabalhando mais, mas ainda está longe de encontrar uma saída para o caos. Embora o número de juízes e desembargadores que trabalham nas cortes estaduais quase não tenha aumentado — foram apenas 13 a mais em 2008 em toda a Justiça Estadual —, eles estão julgando mais. A conclusão é do balanço feito pelo Conselho Nacional de Justiça, o chamado Justiça em Números. O relatório é feito anualmente e foi divulgado pelo órgão de controle do Judiciário com dados de 2008. Clique aqui para ver a primeira parte do relatório sobre a Justiça Estadual, e aqui para ver a segunda.

A reação da segunda instância na guerra contra o crescente acúmulo de processos pode ser vista pela diminuição da taxa de congestionamento de ações em tramitação, e pelo o aumento no número de decisões. Mas embora a carga de trabalho dos juízes tenha aumentado — o que mostra a melhora no desempenho —os estoques nos gabinetes dos magistrados continua a crescer.

Entre 2004 e 2008, a taxa de congestionamento na segunda instância caiu de 52,8% para 42,5%, enquanto a carga de trabalho de cada desembargador subiu de 1,4 mil processos para 2 mil. Ou seja, no ano passsado, cada desembargador julgou 600 processos a mais do que julgava antes. (Veja o gráfico abaixo). Foram 1,8 milhão de decisões, contra 1,5 milhão em 2007, uma eficiência 13,7% maior. Isso significa dizer que, em média, cada desembargador relatou 1,2 mil decisões. Ainda assim, não conseguiu reduzir seu estoque. Pelo contrário. Cada um terminou o ano com, em média, 870 processos a mais.

Trabalho x Taxa de Congestionamento da Justiça Estadual no 2º grau

A situação na primeira instância é ainda mais alarmante. Em 2008, foram 12,2 milhões de casos novos contra os 11,5 milhões que chegaram em 2007 — um crescimento de 6,3%. Os processos parados no primeiro grau em 2007 somavam 32,1 milhões. Mesmo com todo o esforço dos julgadores em 2008, a quantidade subiu para 33,1 milhões, ou 3,1% a mais.

Em primeiro e segundo graus, a Justiça Estadual, encarregada de todos os processos que não sejam trabalhistas ou que envolvam entes do governo federal, acumulou nas mãos 57,1 milhões de ações no ano passado, 81,5% de tudo o que tramita no país. Em comparação com o ano anterior, o crescimento foi de 4%. Só em processos novos, foram 18,7 milhões de ações. Com o aumento no número de processos novos, a taxa de congestionamento média do Judiciário Estadual — índice de ações que aguardam uma decisão — continua alta: 73,1%.

O saldo de ações só diminuiu nos Juizados Especiais Cíveis. Se em 2007 havia 4,029 milhões de processos pendentes, em 2008 a quantidade caiu para 4,026 milhões. Os JECs foram os únicos a registrarem queda de estoque nos Judiciários estaduais. O mesmo não aconteceu nas Turmas Recursais, onde os recursos das decisões dos JEC são julgados. Houve aumento de 14,3% na quantidade de processos pendentes em 2008. O total é de 120 mil. A taxa de congestionamento é a maior já registrada desde 2004, 42%.

Mapa do tráfego
Em todo o país, os maiores estoques das Justiças locais estão na primeira fase dos processos, a primeira instância. São 45,4 milhões de ações aguardando providências. Desse total, 12,25 milhões entraram só em 2008. Apesar de não dar conta do fluxo, o número de decisões também foi alto, 9,26 milhões, 8% a mais do que em 2007. A taxa de congestionamento foi de 79,6%, devido à altíssima carga de trabalho dos juízes no fim do ano passado: em média 5,3 mil processos para cada um dos 8,6 mil magistrados de primeiro grau.

A quantidade de processos em que há recurso aos tribunais foi pequena. De cem decisões de primeira instância, pouco mais de uma foi contestada. A taxa de recorribilidade é de 12%. Os desembargadores receberam 1,9 milhões de recursos em 2008 e julgaram 1,8 milhão. O desempenho manteve o estoque em cerca de 3 milhões de processos aguardando manifestação das cortes.

A esfera estadual da Justiça em todo o país conta com 11.108 magistrados de primeira e segunda instâncias, tanto na Justiça comum quanto nos Juizados Especiais Cíveis. Só para se ter uma ideia de comparação, na Justiça Trabalhista, segunda maior, há 3.145 magistrados. A Federal conta com 1.478 julgadores. O número de julgadores estaduais, no entanto, quase não aumentou em relação ao ano anterior. Em 2007, a soma era de 11.095 juízes e desembargadores.

A Justiça Estadual também foi a que mais gastou em 2008. As despesas somaram R$ 19 bilhões, o equivalente a 57% do total gasto no país com Justiça em primeiro e segundo graus. Dividido pelo número de habitantes, o valor significa um custo de R$ 100,56 por cada brasileiro. Isso mantém o aumento nas despesas do Judiciário. Desde 2004, segundo a pesquisa do CNJ, o crescimento é de 8,9% a cada ano.

Números da Justiça Estadual em 2008

JUSTIÇA ESTADUAL - Jeferson Heroico

Locomotiva ou vagão brecado?
Em São Paulo, que tem o maior tribunal do mundo, chegaram à primeira instância 4,6 milhões de novos processos. Só nos Juizados Especiais, foram 902 mil ações só em 2008. Já no segundo grau entraram 548 mil recursos. Às Turmas Recursais, que apreciam somente apelações dos Juizados Especiais, foram endereçados 84 mil recursos. O Anuário da Justiça Paulista 2008 abordou o assunto - clique aqui para saber mais.

A primeira instância do estado é a que registra maior carga de trabalho em todo o país. Foram 10.612 processos para cada um dos 1.810 juízes, causando um congestionamento de 84% na tramitação de ações. Das decisões dadas, 17,9% subiram à segunda instância para serem reconsideradas. Foram 3,07 milhões de decisões, que deixaram para trás um estoque de 14,61 milhões de processos.

A corte paulista, que aprecia esses recursos, julgou 553,7 mil casos, o que é uma boa notícia. Os 360 desembargadores paulistas conseguiram cuidar de um número maior de processos do que o que entrou no ano passado - 548,1 mil.
Cada um deles foi responsável por uma média de 3.135 julgados no ano, responsável pelo baixo índice de congestionamento - 50,9%. O estoque ainda é de 580,4 mil esperando por uma decisão. Numa perspectiva otimista, mantida a quantidade de novos recursos e o desempenho dos desembargadores em 2008, o tribunal zerará o estoque em, no mínimo, cem anos

Fonte: Consultor Jurídico

quinta-feira, 4 de junho de 2009

MP e interesses individuais indisponíveis


No dia 25 de maio, a 1ª Turma do STF, por unanimidade, reconheceu o óbvio, a saber: o Ministério Público pode manejar ACP - Ação Civil Pública para exigir o fornecimento gratuito de medicamentos pelo Estado em favor de pessoa idosa (RE n. 407.902-RS). A decisão cassou acórdão em sentido contrário do TJ/RS, fundando-se, entre outros argumentos, no princípio de que cabe ao Ministério Público a defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis.
Fonte: Blog do Promotor de Justiça

terça-feira, 2 de junho de 2009

Coluna do Haidar no Consultor Jurídico

Por Rodrigo Haidar

Coluna do Haidar  - Spacca

CNJ guarda chumbo grosso para TJ paulista

O Tribunal de Justiça de São Paulo tem até o fim desta terça-feira para enviar ao Conselho Nacional de Justiça o teor integral da sessão em que desembargadores atribuíram aos conselheiros adjetivos muito pouco recomendáveis. O pedido foi feito por Joaquim Falcão, relator da causa que virou processo contra o presidente do TJ paulista. O CNJ quer enquadrar o tribunal.

A cúpula e a maior parte dos integrantes do Conselho, que já estavam cansados de atos de desobediência e rebeldia dos desembargadores paulistas, se irritaram com as afirmações. “O TJ paulista se acha importante demais para se submeter ao CNJ, mas terá de se adaptar ao novo modelo de Justiça”, afirma um conselheiro. A próxima reunião do Conselho, na terça que vem, promete. No tribunal paulista, tem muito incendiário que já começa a virar bombeiro.



Desconsideração explícita
Os ofícios com as parcas informações que o TJ paulista mandou ao CNJ até hoje, sobre dezenas de procedimentos que envolvem o tribunal, nunca foram assinados pelo presidente, Valim Bellocchi. Sempre por seus auxiliares. A assinatura mais assídua nas informações, sempre incompletas, é a do juiz James Siano. Conselheiros consideram o fato, no mínimo, atípico, principalmente em um tribunal tão apegado à liturgia dos atos.



Revolução Farroupilha
A rebeldia judicial — ou jus esperniandi — não é privilégio do tribunal paulista. Ministros do Superior Tribunal de Justiça criticaram recentemente o fato de que, mesmo nos casos julgados pelo rito dos recursos repetitivos, os tribunais de segunda instância insistem em decidir de forma diferente da Corte. Falta senso de racionalidade. O tribunal mais rebelde é, de longe, o TJ gaúcho.



Queda festejada
A novidade mais surpreendente das últimas décadas — a notícia da queda do volume de recursos no Supremo Tribunal Federal — é uma tendência e não apenas uma bolha de felicidade. O STF acaba de confirmar que, depois de cair em 41% de 2007 para 2008, a montanha de recursos voltou a baixar, mais ainda, em 2009: 45% desta vez. Para alegrar ainda mais a festa, registrou-se também redução de 25% no volume de processos protocolados, sinal de que a Repercussão Geral já começou a segurar as causas pacificadas nos fóruns e tribunais.



Limpando a pauta
Os conselheiros Felipe Locke, Marcelo Nobre e José Adônis não devem levar processos de sua relatoria à próxima sessão do CNJ. Como eles continuam no Conselho, deram espaço para que seus colegas, que só têm mandato até 14 de junho, consigam sair com as prateleiras vazias, ou quase.



Prestação de contas
O nome do conselheiro Marcelo Nobre, por sinal, vem sendo bastante comentado nos corredores da Câmara dos Deputados. Motivo: ao completar um ano no CNJ, ele enviou a todos os deputados uma certidão expedida pelo Conselho prestando contas de seu trabalho. Esteve presente em todas as sessões, participou do julgamento de 1.801 processos e proferiu 195 votos. Nobre foi indicado ao CNJ na vaga da Câmara.



FALOU E DISSE
“É inconcebível a prática em que o juiz profere a decisão e depois vai ao caixa pegar o ticket pelo pagamento do voto”.
Técio Lins e Silva, conselheiro do CNJ, sobre o auxílio-voto pago a juízes paulistas.


FORA DOS AUTOS
O lorde de Catolé do Rocha
Em sessão da 2ª Turma do STJ, ano passado, os ministros julgavam recurso sobre a necessidade de licitação para a concessão dos serviços de transportes públicos numa cidade do interior do Pará.

Conhecido pelo bom gosto e refinamento, o ministro Herman Benjamin justificava seu voto pela continuidade do serviço, mesmo sem licitação: “Eu penso no povo pobre e sofrido daquela região. Quando eu morava em Catolé do Rocha (PB), levávamos oito horas até João Pessoa em ônibus velhos, caindo aos pedaços. Se por acaso algum magistrado impedisse aquele ônibus de circular, nós tínhamos que ir em caminhões paus de arara”.

O presidente da turma, ministro Castro Meira, natural do município baiano de Livramento de Nossa Senhora, não se conteve: “Vossa Excelência já andou em pau de arara?”

Herman Benjamin: Sim, ministro!

Castro Meira: “Peço mil desculpas, mas, honestamente, não consigo visualizar Vossa Excelência com essa pose, esse estilo de lorde, num pau de arara, com animais e mercadorias, lendo poesias francesa ou pedindo silêncio a um bode para apreciar literatura inglesa, numa viagem de oito horas entre Catolé do Rocha e João Pessoa. Isso é coisa para mim ou quem sabe para o ministro Humberto Martins, mas sendo Vossa Excelência, a imagem fica difícil. Vou liderar uma divergência!”

STF nega a DD o acesso ao inquérito da Satiagraha

Na bica de sofrer nova denúncia do Ministério Público, o investigado-geral da República Daniel Dantas obteve uma má notícia do STF.

O mandachuva do Oportunitty batera às portas do Supemo para reclamar de uma decisão tomada pelo juiz Fausto de Sanctis.

O magistrado recebera do delegado Ricardo Saadi as conclusões da segunda fase da Satiagraha. E remetera a papelada ao procurador Rodrigo de Grandis.

Antes, De Sanctis indeferira uma petição em que a defesa de Dantas pedia para ter acesso aos autos antes do envio da peça ao Ministério Público.

O juiz entendeu que não é hora de Dantas e outros encrencados do Opoortunity exercerem o direito ao contraditório.

A defesa terá a oportunidade de se posicionar depois que o procurador De Grandis formular a sua denúncia.

Em habeas corpus que protocolara no STF, a defesa de Daniel Dantas se insurgira contra a decisão do juiz. Queria porque queria manusear os autos já.

O pedido caíra sobre a mesa do ministro Eros Grau. Nesta segunda (1º), veio a decisão. Indeferido, o habeas corpus foi ao arquivo.

Eros Grau deu razão a De Sanctis. Considerou que o acesso dos acusados Às conclusões da PF antes do envio da peça à Procuradoria não tem amparo legal.

O ministro citou os termos de uma súmula do STF, a de número 14. Anotou que o texto prevê “acesso amplo” dos acusados às acusações. Porém...

Porém, escreveu que “acesso amplo” não se confunde com “acesso irrestrito aos autos do inquérito policial”, sob pena de comprometer o “regular e fluente andamento”.

Eros Grau acrescentou: “Os trâmites procedimentais referentes às investigações policiais hão de ser atendidos...”

“...Sem antecipações de vista das quais resulte a ampliação de prazos, da defesa, estabelecidos em lei”.

Ou seja, Daniel Dantas e Cia. terão de aguardar pela manifestação do Ministério Público antes de se defender das novas acusações.

A futura denúncia será a segunda resultante da Satiagraha. A primeira produziu a condenação de Daniel Dantas a 10 anos de cadeia.

Foi condenado, junto com outros réus, por corrupção ativa. Recorreu. E responde em liberdade à acusação de ter tentado subornar um delegado da PF.

Fonte: Blog do Josias de Souza

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Artigo de Ada Pellegrini Grinover sobre a iniciativa instrutória do juiz no processo penal


A INICIATIVA INSTRUTÓRIA DO JUIZ NO PROCESSO PENAL ACUSATÓRIO

ADA PELLEGRINI GRINOVER
Professora Titular de Processo Penal da Universidade de São Paulo



SUMÁRIO:


1. Justificativa do tema. 2. Significado e alcance da expressão "sistema acusatório". 3. Sistema acusatório e "adversarial system". 4. A concepção publicista do processo e sua função social: o papel do juiz. 5. A iniciativa instrutória do juiz no processo moderno. 6. Os limites da atividade instrutória oficial: contraditório, motivação das decisões judiciárias, licitude (material) e legitimidade (processual) das provas. 7. A iniciativa instrutória do juiz no processo penal e no processo civil. Verdade real e verdade formal. 8. Conclusões.


1. A propagação do modelo acusatório na América Latina, indubitavelmente promovida pelo Código-Modelo de Processo Penal para Ibero-América, acarretou em diversos países e está trazendo em outros profundas modificações no sistema inquisitório antes difuso na América espanhola, com evidentes vantagens no tocante a um processo aderente às garantias constitucionais e fiel às normas da Convenção Americana dos Direitos Humanos.


No entanto, alguns equívocos têm surgido aqui e acolá, a partir da errônea concepção do que se deve entender por "processo acusatório" e "processo inquisitivo", assim como pelo significado da expressão "processo de partes", ligada ao primeiro modelo.


Esses mal-entendidos têm induzido alguns teóricos e certos sistemas a confundir o sistema acusatório moderno com o adversarial system dos países anglo-saxônicos, com profundas repercussões sobre o papel do juiz no processo penal.
Desfazer esses equívocos, ou ao menos esclarecer alguns conceitos, é o objetivo desse trabalho.


2. A ambigüidade e indeterminação do binômio "acusatório-inquisitório" são conhecidas, sendo polivalente seu sentido. Por isso nos preocupamos, em diversos escritos, em salientar aquilo que distingue, sinteticamente, o modelo acusatório do inquisitório. No primeiro, as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a órgãos distintos, enquanto no segundo as funções estão reunidas e o inquisidor deve proceder espontaneamente. É só no processo acusatório que o juízo penal é o actum trium personarum, de que falava Búlgaro, enquanto no processo inquisitório a investigação unilateral a tudo se antepõe, tanto que dele disse Alcalá-Zamora não se tratar de processo genuíno, mas sim de forma autodefensiva da administração da justiça. Onde aparece o sistema inquisitório poderá haver investigação policial, ainda que dirigida por alguém chamado juiz, mas nunca verdadeiro processo.


Decorrem desse conceito sintético diversos corolários: a) os elementos probatórios colhidos na fase investigatória, prévia ao processo, servem exclusivamente para a formação do convencimento do acusador, não podendo ingressar no processo e ser valorados como provas (salvo se se tratar de prova antecipada, submetida ao contraditório judicial, ou de prova cautelar, de urgência, sujeita a contraditório posterior); b) o exercício da jurisdição depende de acusação formulada por órgão diverso do juiz (o que corresponde ao aforisma latino nemo in iudicio tradetur sine accusatione); c) todo o processo deve desenvolver-se em contraditório pleno, perante o juiz natural.


Essas idéias, expostas e publicadas em diversas oportunidades no Brasil e no exterior - incluindo diversas Jornadas do Instituto Ibero-americano de Direito Processual - jamais mereceram qualquer contestação. Vê-se daí que o conceito de processo acusatório e de processo de partes (no sentido de a acusação e a defesa serem sujeitos da relação jurídica processual, juntamente com o juiz) nada tem a ver com a iniciativa instrutória do juiz no processo penal.


3. O que tem a ver, sim, com os poderes instrutórios do juiz no processo é o denominado adversarial system, próprio do sistema anglo-saxão, em contraposição ao inquisitorial system, da Europa continental e dos países por ela influenciados.


Denomina-se adversarial system o modelo que se caracteriza pela predominância das partes na determinação da marcha do processo e na produção das provas. No inquisitorial system, ao revés, as mencionadas atividades recaem de preferência sobre o juiz. Vê-se por aí a importância do correto entendimento dos termos acusatório-inquisitório (no sentido empregado no nº 2 deste trabalho) e adversarial-inquisitorial (no sentido utilizado agora). O termo processo inquisitório, em oposição acusatório, não corresponde ao inquisitorial (em inglês), o qual se contrapõe ao adversarial. Um sistema acusatório pode adotar o adversarial system ou o inquisitorial system, expressão que se poderia traduzir por processo de desenvolvimento oficial. Ou seja, firme restando o princípio da demanda, pelo qual incumbe à parte a propositura da ação, o processo se desenvolve por impulso oficial.


Acusatório-inquisitório e adversarial-inquisitorial são categorias diversas, em que os termos devem ser utilizados corretamente. De um lado, portanto, o contraste ocorre entre sistema acusatório e sistema inquisitório, no sentido empregado para o processo penal no nº 2 deste estudo; do outro lado, a oposição manifesta-se, tanto no processo penal como no civil, entre o adversarial e o inquisitorial system, vale dizer entre um processo que, uma vez instaurado (mantido, assim, o princípio da demanda, ou Dispositionsmaxime, na terminologia alemã), se desenvolve por disposição das partes (o que se denomina em alemão Verhandlungsmaxime) e processo de desenvolvimento oficial.


Para ilustrar o segundo binômio - condução do processo por disposição das partes e desenvolvimento oficial -, especificamente no que diz respeito à iniciativa probatória, vale lembrar o caso referido pela literatura inglesa, relativamente a juiz cujo julgamento foi anulado, sendo o magistrado convencido a demitir-se, por ter formulado às testemunhas perguntas demais, o que feriria o fair trial. Como bem aponta José Carlos Barbosa Moreira, no nosso sistema bem que alguns juízes mereceriam, ao contrário, ao menos uma advertência por fazer poucas perguntas, ou nenhuma ("Notas sobre alguns aspectos do processo - civil e penal - nos países anglo-saxônicos", Rev. Forense, vol. 344, p. 98).


Cumpre observar, ainda, que nos próprios ordenamentos anglo-saxônicos existem várias exceções à regra do predomínio das partes, abrindo-se espaço maior à intervenção do juiz. O caráter adversarial do sistema vai cedendo espaço ao desenvolvimento oficial, e a distinção entre os dois processos parece tender a uma atenuação cada vez mais perceptível (Barbosa Moreira, loc. cit., p. 99, com bibliografia). Além dos sinais de mudanças, é também oportuno salientar as críticas que se levantam contra o sistema até agora dominante no processo civil inglês: várias propostas legislativas propugnam no sentido de a condução do feito anterior ao trial não ser mais deixado quase exclusivamente ao cuidado das partes, devendo submeter-se ao controle do órgão judicial, até para atenuar os problemas de procrastinações indesejáveis que incidem sobre o custo e a duração do processo. E, no processo norte-americano, toma corpo a idéia de que vale a pena buscar em sistemas continentais europeus sugestões para problemas que afligem a justiça criminal (Barbosa Moreira, loc. cit., pp. 108-109, com bibliografia).


4. Mas a escolha entre o adversarial system e o do desenvolvimento oficial não deve ser determinada apenas pela maior ou menor eficiência de um em relação ao outro. À raiz do modelo que confia ao juiz a condução do processo, inclusive no que diz respeito à iniciativa instrutória, está uma escolha política que diz respeito à concepção publicista do processo e à percepção de sua função social.


O direito processo é ramo autônomo do direito, regido por princípios publicistas. Tem ele fins distintos de seu conteúdo e esses fins se confundem com os objetivos do próprio Estado, na medida em que a jurisdição é uma de suas funções. Os objetivos da jurisdição e do seu instrumento, o processo, não se colocam com vista à parte, a seus interesses e a seus direito subjetivos, mas em função do Estado e dos objetivos deste.


A observância das normas jurídicas postas pelo direito material interessa à sociedade. Por via de conseqüência, o Estado tem que zelar por seu cumprimento, uma vez que a paz social somente se alcança pela correta atuação das regras imprescindíveis à convivência das pessoas. Quanto mais o provimento jurisdicional se aproximar da vontade do direito substancial, mais perto se estará da verdadeira paz social.


Trata-se da função social do processo, que depende de sua efetividade. Nesse quadro, não é possível imaginar um juiz inerte, passivo, refém das partes. Não pode ele ser visto como mero espectador de um duelo judicial de interesse exclusivo dos contendores. Se o objetivo da atividade jurisdicional é a manutenção da integridade do ordenamento jurídico, para o atingimento da paz social, o juiz deve desenvolver todos os esforços para alcançá-lo. Somente assim a jurisdição atingirá seu escopo social.


O papel do juiz, num processo publicista, coerente com sua função social, é necessariamente ativo. Deve ele estimular o contra- ditório, para que se torne efetivo e concreto. Deve suprir às deficiências dos litigantes, para superar as desigualdades e favorecer a par condicio. E não pode satisfazer-se com a plena disponibilidade das partes em matéria de prova.


5. Nessa visão, que é eminentemente política, é inaceitável que o juiz aplique normas de direito substancial sobre fatos não suficientemente demonstrados. O resultado da prova é, na grande maioria dos casos, fator decisivo para a conclusão última do processo. Por isso, deve o juiz assumir posição ativa na fase instrutória, não se limitando a analisar os elementos fornecidos pelas partes, mas determinando sua produção, sempre que necessário.


Ninguém melhor do que o juiz, a quem o julgamento está afeto, para decidir se as provas trazidas pelas partes são suficientes para a formação de seu convencimento. Isto não significa que a busca da verdade seja o fim do processo e que o juiz só deva decidir quando a tiver encontrado. Verdade e certeza são conceitos absolutos, dificilmente atingíveis, no processo ou fora dele.


Mas é imprescindível que o juiz diligencie a fim de alcançar o maior grau de probabilidade possível. Quanto maior sua iniciativa na atividade instrutória, mais perto da certeza ele chegará.


O juiz deve tentar descobrir a verdade e, por isso, a atuação dos litigantes não pode servir de empecilho à iniciativa instrutória oficial. Diante da omissão da parte, o juiz em regra se vale dos demais elementos dos autos para formar seu convencimento.


Mas, se os entender insuficientes, deverá determinar a produção de outras provas, como, por exemplo, ouvindo testemunhas não arroladas no momento adequado. Até as regras processuais sobre a preclusão, que se destinam apenas ao regular desenvolvimento do processo, não podem obstar ao poder-dever do juiz de esclarecer os fatos, aproximando-se do maior grau possível de certeza, pois sua missão é pacificar com justiça. E isso somente acontecerá se o provimento jurisdicional for o resultado da incidência da norma sobre fatos efetivamente ocorridos.


Nada disso é garantido pelo adversarial system, em que a plena disponibilidade das provas pelas partes é reflexo de um superado liberal-individualismo, que não mais satisfaz à sociedade. Além do mais, a omissão da parte na instrução do feito é freqüentemente devida a uma situação de desequilíbrio material, em que preponderam fatores institucionais, econômicos ou culturais. O reforço dos poderes instrutórios do juiz desponta, nesse panorama, como instrumento para atingir a igualdade entre as partes.


A visão do Estado social não admite a posição passiva e conformista do juiz, pautada por princípios essencialmente individualistas. O processo não é um jogo, em que pode vencer o mais poderoso ou o mais astucioso, mas um instrumento de justiça, pelo qual se pretende encontrar o verdadeiro titular do direito. A pacificação social almejada pela jurisdição sofre sério risco quando o juiz permanece inerte, aguardando passivamente a iniciativa instrutória da parte.


A iniciativa oficial no campo da prova, por outro lado, não embaça a imparcialidade do juiz. Quando este determina que se produza uma prova não requerida pelas partes, ou quando entende oportuno voltar a inquirir uma testemunha ou solicitar esclarecimentos do perito, ainda não conhece o resultado que essa prova trará ao processo, nem sabe qual a parte que será favorecida por sua produção. Longe de afetar sua imparcialidade, a iniciativa oficial assegura o verdadeiro equilíbrio e proporciona uma apuração mais completa dos fatos. Ao juiz não importa que vença o autor ou o réu, mas interessa que saia vencedor aquele que tem razão.


Ainda que não atinja a verdade completa, a atuação ativa do juiz lhe facilitará inegavelmente o encontro de uma parcela desta.


6. Mas a atuação do juiz na atividade instrutória não é ilimitada. Existem balizas intransponíveis à iniciativa oficial, que se desdobram em três parâmetros: a rigorosa observância do contraditório, a obrigatoriedade de motivação, os limites impostos pela licitude (material) e legitimidade (processual) das provas.


O contraditório, entendido como participação das partes e do juiz na colheita da prova, constitui o primeiro parâmetro para a atividade instrutória oficial. Por isso mesmo prefere-se o termo "iniciativa do juiz" ao de "atividade do juiz", porquanto o primeiro melhor representa a necessidade de as partes participarem, com o magistrado, da colheita da prova. A participação das partes e do juiz na atividade instrutória é condição de validade das provas e não podem ser consideradas provas aquelas que não forem produzidas com a concomitante presença do juiz e das partes. A melhor maneira de preservar a imparcialidade do juiz não é alijá-lo da iniciativa instrutória, mas sim submeter todas as provas - as produzidas pelas partes e as determinadas ex officio pelo juiz - ao contraditório.


A segunda baliza em que deve conter-se a iniciativa instrutória oficial é a obrigação de motivação das decisões judiciárias. Seja no momento de determinar a produção de uma prova, seja no momento de valorá-la, a decisão do juiz há de ser fundamentada. A ausência ou carência de motivação acarreta a invalidade da prova.


Por último, o juiz, tanto quanto as partes, encontra outro limite à atividade instrutória na licitude e legitimidade das provas. Há uma regra moral intransponível que rege toda a atividade processual, recepcionada de forma explícita pelas constituições de diversos países. Não são provas as colhidas com infringência a normas ou valores constitucionais, nem pode o juiz determinar a produção de provas que vulnerem regras processuais. Trata-se do tema das provas ilícitas e ilegítimas, que não podem ingressar no processo nem, evidentemente, ser determinadas de ofício pelo juiz. A certeza buscada em juízo deve ser ética, constitucional e processualmente válida.


Assim, a utilização de poderes instrutórios pelo juiz encontra seus limites na observância do contraditório, na obrigação de motivação das decisões e na exclusão das provas ilícitas e ilegítimas.


7. O que se disse acima aplica-se a qualquer processo, penal ou não penal. Não tem nada a ver com o sistema acusatório, também chamado de partes, não tem nada a ver com o processo civil dispositivo. Tem a ver, exclusivamente, com a visão publicista do processo e com a sensibilidade para com a sua função social.


Como visto, o modelo acusatório do processo penal não interfere com os poderes instrutórios do juiz. Suas características fundamentais são bem diversas. A separação nítida das funções de acusar, defender e julgar não demandam um juiz inerte e passivo.


A questão que envolve os elementos probatórios colhidos durante a investigação e sua inidoneidade para servir de base para a formação do convencimento do juiz é estranha à problemática da iniciativa instrutória oficial. Esta se circunscreve ao processo, o qual é instaurado após acusação formal do Ministério Público (ou do querelante, seu substituto processual, na ação penal de iniciativa privada). Não se confunda o que se disse quanto aos poderes do juiz no processo e à sua iniciativa probatória com a atribuição de poderes para buscar elementos probatórios durante a fase da investigação prévia. Esta não pode ser confiada ao juiz, sob pena de se retornar ao juiz-inquisidor do modelo antigo. Durante a investigação, o juiz do processo acusatório tem apenas a função de determinar providências cautelares.


Por isso, é oportuno que o juiz da investigação prévia (a cargo do Ministério Público e/ou da polícia judiciária) seja diverso do juiz do processo. É neste, e somente neste, que deve ser estimulada a iniciativa oficial.


No processo civil, a regra da iniciativa oficial no campo probatório impõe-se mesmo quando o objeto do processo forem relações disponíveis de direito material. Seria até fácil sustentar que no processo civil dispositivo não cabe a iniciativa instrutória do juiz, reservada aos processos que versem sobre direitos indisponíveis, entre os quais avulta o processo penal. Mas não é disso que se trata.


José Roberto dos Santos Bedaque, na obra Poderes instrutórios do juiz (Ed. Revista dos Tribunais, 2ª ed., São Paulo, pp. 65 e segs.), demonstra à saciedade que a iniciativa instrutória oficial não passa exclusivamente pelo processo civil que verse sobre direitos indisponíveis. A disponibilidade do direito material não influi sobre o processo, que, como instrumento da função estatal, tem invariavelmente natureza pública e cuja finalidade social, de pacificar com justiça, não se altera consoante seu objeto.


O papel ativo do juiz na produção da prova não afeta de modo algum a liberdade das partes. Têm elas a plena disponibilidade do direito material, podendo, por exemplo, renunciar, transigir, desistir. Mas a solução processual está nas mãos do juiz, que não pode por isso ser obrigado a satisfazer-se com a atividade das partes, mesmo no processo civil dispositivo.


Assim, pode-se afirmar que a questão referente à iniciativa instrutória do juiz no processo não se vincula à dicotomia direitos disponíveis-direitos indisponíveis, a qual se restringe exclusivamente ao campo do direito material. Ainda que disponível a relação material, o Estado tem interesse em que a tutela jurisdicional seja prestada da melhor maneira possível. Já asseverava Calamandrei que a ampliação dos poderes do juiz no campo probatório não é incompatível com o objeto do processo (Istituzioni di diritto processuale civile, in Opere Giuridiche, Morano Ed., Nápoles, vol. IV, 1970, p. 223).


Vê-se daí não há qualquer razão para continuar sublinhando a distinção entre "verdade real" e "verdade formal", entendendo a primeira própria do processo penal e a segunda típica do processo civil. O conceito de verdade, como já dito, não é ontológico ou absoluto. No processo, penal ou civil que seja, o juiz só pode buscar uma verdade processual, que nada mais é do que o estágio mais próximo possível da certeza. E para que chegue a esse estágio, deverá ser dotado de iniciativa instrutória.


Por isso mesmo, o termo "verdade real", no processo penal e no processo civil, indica uma verdade subtraída à exclusiva influência que as partes, por seu comportamento processual, queiram exercer sobre ela. E isso vale para os dois processos, em matéria probatória.


A diferença que persiste reside na existência, no processo civil, de fatos incontroversos, sobre os quais se admite a prova, resumindo-se a controvérsia a uma questão de direito, enquanto no processo penal tradicional não pode haver convergência das partes sobre os fatos. O juiz penal, mesmo diante de fatos incontroversos, deve sempre pesquisar com a finalidade de determinar a produção da prova capaz de levá-lo ao conhecimento dos fatos da maneira mais próxima possível à certeza. Mas, aqui também, as tendências rumo à justiça penal consensual estão modificando os dados da questão.


O princípio da verdade real, que foi o mito de um processo penal voltado para a liberdade absoluta do juiz e para a utilização de poderes ilimitados na busca da prova, significa hoje simplesmente a tendência a uma certeza próxima da verdade judicial: uma verdade subtraída à exclusiva influência das partes pelos poderes instrutórios do juiz e uma verdade ética, processual e constitucionalmente válida.


Isso para os dois tipos de processo, penal e não penal. E ainda, agora exclusivamente para o processo penal tradicional, indica uma verdade a ser pesquisada mesmo quando os fatos forem incontroversos, com a finalidade de o juiz aplicar a norma de direito material aos fatos realmente ocorridos, para poder pacificar com justiça.


8. Em conclusão, afirma-se:


a) O processo penal acusatório, ou processo de partes (em contraposição ao inquisitório), deve ser entendido, sinteticamente, como aquele em que as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a órgãos diversos, daí decorrendo os seguintes corolários: a1) os elementos probatórios colhidos na investigação prévia servem exclusivamente para a formação do convencimento do acusador, não podendo ingressar no processo e ser valorados como provas; a2) o exercício da jurisdição depende de acusação formulada por órgão diverso do juiz; a3) todo o processo deve desenvolver-se em contraditório pleno, perante o juiz natural;


b) O conceito de processo penal acusatório não interfere com a iniciativa instrutória do juiz no processo;


c) Tem a ver com os poderes instrutórios do juiz no processo o denominado adversarial system, do direito anglo-saxão, em oposição ao inquisitorial system, do sistema continental europeu e dos países por este influenciados;


d) Denomina-se adversarial system o modelo que se caracteriza pela predominância das partes na determinação da marcha do processo e na produção das provas. No inquisitorial system, ao revés, as mencionadas atividades recaem de preferência sobre o juiz;


e) A dicotomia processo acusatório-processo inquisitório, no sentido utilizado na alínea a, não corresponde ao binômio adversarial-inquisitorial (em inglês). Um sistema penal acusatório pode adotar o modelo adversarial ou inquisitorial;


f) A fim de evitar confusões terminológicas, propomos que, na segunda dicotomia, a expressão adversarial-inquisitorial system seja traduzida por processo que se desenvolve por disposição das partes e processo de desenvolvimento oficial. Isto significa que, no chamado inquisitorial system, uma vez proposta a ação (princípio da demanda, ou Dispositionsmaxime), o processo se desenvolve por impulso oficial e não por disposição das partes (não adotando, na terminologia alemã, a Verhandeungsmaxime);


g) Mesmo nos países anglo-saxônicos, o caráter adversarial do sistema vai cedendo espaço ao desenvolvimento oficial. Mas mais importante do que isso são os princípios que informam o modelo de desenvolvimento oficial: quais sejam, a concepção publicista do processo e a percepção de sua função social;


h) O direito processual é regido por princípios publicistas e tem fins que se confundem com os objetivos do Estado, na medida em que a jurisdição é uma das suas funções. Os objetivos da jurisdição e do processo não se colocam com vistas às partes e a seus interesses, mas em função do Estado e de seus objetivos.


Pacificar com justiça é a finalidade social da jurisdição e quanto mais o provimento jurisdicional se aproximar da vontade do direito substancial, mais perto se estará da paz social;


i) Trata-se da função social do processo, que depende de sua efetividade. Nesse quadro, não é possível imaginar um juiz inerte, passivo, refém das partes. No processo publicista, o papel do juiz é necessariamente ativo. Deve ele estimular o contraditório, para que se torne efetivo e concreto; deve suprir às deficiências dos litigantes, para superar as desigualdades e favorecer a par condicio. E deve ter iniciativa probatória, não podendo limitar-se a analisar os elementos fornecidos pelas partes, mas determinando sua produção, sempre que necessário;


j) Verdade e certeza são conceitos absolutos, dificilmente atingíveis. Mas é imprescindível que o juiz diligencie a fim de alcançar o maior grau de probabilidade possível. Quanto maior sua iniciativa instrutória, mais perto da certeza chegará;


k) Nada disso é garantido pelo adversarial system, em que a plena disponibilidade das provas pelas partes é reflexo de um superado liberal-individualismo, que não mais satisfaz à sociedade. Além do mais, a omissão da parte na instrução do feito é freqüentemente devida a uma situação de desequilíbrio material, em que preponderam fatores institucionais, econômicos e culturais. O reforço dos poderes instrutórios do juiz representa instrumento valioso para atingir a igualdade real;


l) A iniciativa oficial no campo da prova não embaça a imparcialidade do juiz.


Quando este determina a produção de prova não requerida pelas partes, ainda não conhece o resultado que essa prova trará ao processo, nem sabe qual a parte que será favorecida por sua produção. Ao juiz não importa que vença o autor ou o réu, mas interessa que saia vencedor aquele que tem razão;


m) Mas a atuação do juiz na atividade instrutória não é ilimitada. Existem balizas intransponíveis à iniciativa oficial, que se desdobram em três parâmetros: m1) a rigorosa observância do contraditório; m2) a obrigatoriedade da motivação; m3) os limites impostos pela licitude (material) e legitimidade (processual) das provas;


n) O contraditório, entendido como participação das partes e do juiz na colheita da prova, é condição de validade das provas. Não podem ser consideradas provas as que forem produzidas sem a concomitante presença do juiz e das partes. Todas as provas - produzidas pelas partes ou determinadas ex officio pelo juiz - devem ser submetidas ao contraditório, sob pena de invalidade;


o) A obrigação de motivação é a segunda baliza em que deve conter-se a iniciativa probatória oficial. Seja no momento de determinar a produção da prova, seja no momento de valorá-la, a decisão do juiz há de ser fundamentada, sob pena de nulidade;


p) O terceiro limite à iniciativa probatória do juiz consiste na licitude (material) e na legit imidade (processual) das provas cuja produção determinada. Não são provas as colhidas com infringência a normas ou valores constitucionais, nem pode o juiz determinar de ofício provas que vulnerem regras processuais. A certeza buscada em juízo deve ser ética, constitucional e processualmente válida;


q) O acima exposto aplica-se a qualquer processo, penal e não-penal. Observe-se, para o processo penal, que é estranha ao tema a questão dos elementos probatórios colhidos durante a investigação prévia e de sua inidoneidade para servir de base à formação do convencimento do juiz. Não se confundia a iniciativa instrutória do juiz no processo com a atribuição de poderes de busca da prova na fase de investigação. Durante esta, o juiz só pode ter os poderes de determinar medidas cautelares, sob pena de voltar-se à figura do juiz-inquisidor do processo antigo;


r) Não há razão para se retirar do juiz a iniciativa instrutória, mesmo no processo civil que verse sobre direitos disponíveis. A disponibilidade do direito material não influi sobre o processo que, como instrumento da função estatal, tem invariavelmente natureza pública e função social. O papel ativo do juiz na produção da prova não afeta a liberdade das partes, que podem renunciar, transigir, desistir. Mas a solução processual está nas mãos do juiz, que não pode por isso ser obrigado a satisfazer-se com a atividade instrutória das partes, mesmo no processo civil dispositivo;


s) Vê-se daí que não há porque continuar sublinhando a distinção entre "verdade real" (para o processo penal) e "verdade formal" (para o processo civil). O conceito de verdade não é ontológico nem absoluto, e no processo - penal ou civil que seja - o juiz só pode buscar a verdade processual, que nada mais é do que o estágio mais próximo possível da certeza. E para que chegue a esse estágio, deve ser dotado de iniciativa instrutória;


t) Nos dois tipos de processo, deve entender-se por "verdade real" a verdade subtraída à exclusiva influência das partes. A diferença que persiste reside na existência, no processo civil, de fatos incontroversos, sobre os quais não se admite prova, enquanto no processo penal tradicional, mesmo diante de fatos incontroversos, o juiz deve sempre pesquisar com a finalidade de determinar a produção da prova capaz de levá-lo ao conhecimento dos fatos. Mas, aqui também, a tendência rumo à justiça penal consensual está aproximando o processo penal do processo civil;


u) O princípio da verdade real, que foi o mito de um processo penal voltado para a liberdade absoluta do juiz e para a utilização de poderes ilimitados na busca da prova, significa hoje simplesmente a tendência a uma certeza próxima da verdade judicial: uma verdade subtraída à exclusiva influência das partes pelos poderes instrutórios do juiz e uma verdade ética, constitucional e processualmente válida. Isso para os dois tipos de processo, penal e não-penal. E ainda, agora exclusivamente para o processo penal tradicional, uma verdade a ser pesquisada mesmo quando os fatos forem incontroversos.