quarta-feira, 31 de outubro de 2012

A Cultura da Generalização



Por Edivan Rodrigues Alexandre*

“Creia-me, a pior desgraça que poderia ocorrer a um magistrado seria pegar aquela terrível doença dos burocratas que se chama conformismo. É uma doença mental semelhante à agorafobia: é o pavor da independência própria, uma espécie de obsessão, que não espera as recomendações externas, mas precede-as, que não se dobra às pressões dos superiores, mas as imagina e satisfaz antecipadamente.”

Piero Calamandrei (Eles, os Juízes, vistos por um advogado. Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 279)

 

                   Nos últimos tempos, temos assistido a um desvirtuamento das funções dos órgãos correcionais do Poder Judiciário.

                   Corregedoria é órgão de fiscalização e controle do trabalho de uma instituição e tem obrigação legal de agir em casos de desvio de conduta.

                   No entanto, é possível observar que ultimamente as denúncias de desvio de conduta não têm servido para apurar o ilícito funcional em si, buscando a responsabilidade do magistrado, mas sim para instrumentalização de denúncias contra o próprio Poder Judiciário, de forma generalizada e por meio da imprensa. 

                   Denominei esta situação de cultura da generalização.

                   A cultura da generalização tem trazido conseqüências danosas para o sistema de justiça e banalizado o importante papel dos órgãos correcionais.

                   O surgimento dessa cultura advém da falta de conhecimento das funções e dos meios de atuação das Corregedorias.

                   A função correcional não se equipara a função jurisdicional. O ato de fiscalização exige poder de ação, de atuação e de iniciativa. Não se aplica às corregedorias a proibição de não poder proceder de ofício, característica do ofício judicante. É dever do órgão correcional, ao tomar conhecimento de faltas disciplinares, iniciar o devido procedimento de sindicância.

                   Não é possível afirmar o motivo determinante, mas o certo é que, ao tomar conhecimento de procedimentos inadequados de algum magistrado, as corregedorias não estão agindo pontualmente contra aquele determinado magistrado, como deveria. De outra forma, busca-se dar publicidade a conduta, por meio da imprensa, generalizando um comportamento individualizado e o tornando comum a toda uma classe uma conduta que se revela de poucos.

                   Essa cultura é bastante assimilada pela imprensa, que dá especial destaque aos famosos bordões contra a Magistratura e ao próprio Poder Judiciário.

                   É fato que são diminutos os números de casos de corrupção por parte de juízes no Brasil.

Segundo dados da Associação dos Magistrados da Justiça Militar Federal (Amajum), “nos sete anos de existência do CNJ, 49 magistrados foram punidos com sanções que variaram desde a advertência até a aposentadoria compulsória. Vale observar que há 17.000 juízes atuando no Brasil, nas diversas áreas (Federal, Estadual, Trabalhista e Militar), o que representa 49 em 17 mil; cerca de 0,2%.

No entanto, devido à cultura da generalização, restou arraigado na sociedade a existência de “bandidos de toga”.

                   A última moda da cultura da generalização são os “juízes TQQ”, uma referência aos juízes que só trabalhariam as terças, quartas e quintas-feiras.

                   Ora, se há juiz “bandido de toga” é obrigatório que se aponte, inicie-se o devido processo legal e, sendo comprovado, que seja expurgado dos quadros do Poder Judiciário.

                   De outra forma, se há detecção de juiz que não comparece ao trabalho, que seja denunciado e punido.

                   Não é aceitável que por uns todos paguem.

                   A cultura da generalização tem trazido para o seio do Judiciário a condenação pública da Magistratura, e o pior, tem desestimulado os juízes honestos e operosos que se sentem atingidos pelas acusações generalizadas.

                   É necessário repensar a forma de atuação das corregedorias. Não se pode aceitar a prática omissa dos órgãos correcionais frente aos casos localizados de desvios de condutas. De outra forma, não se deve aceitar que casos pontuais sejam usados para levantar suspeitas sobre os demais membros do Poder Judiciário.

Nesse caso, o popular se sobressai ao erudito, no sentido de que é preferível identificar e retirar as maçãs podres do cesto (Ditado Popular), a afirmar de que “não há o que escolher num saco de batatas podres” (William Shakespeare - A Megera Domada).

Toda generalização é sempre perigosa, exigindo-se cuidado dos órgãos correcionais pelas informações que presta à imprensa, para que não crie, artificialmente, na opinião pública conceitos errôneos e que não contribuem para o engrandecimento da Magistratura e do Poder Judiciário.

Opiniões que pecam pela generalização depreciativa não contribuem para o aprimoramento das instituições e servem tão somente para fins mediáticos e não correcionais.

Campina Grande 15 de outubro de 2012


*Edivan Rodrigues Alexandre
Juiz de Direito – Titular da Vara de Entorpecentes – Campina Grande
Licenciado em Filosofia pela FAFIC – Cajazeiras
E-mail: edvanparis@uol.com.br
Twitter: @EdivanRodrigues

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