sábado, 6 de dezembro de 2014

Supremo, Política e políticos


LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO

Supremo, política e políticos

A mais alta corte do país, que zela pela Constituição, não merece ser juizado de pequenas causas

Por que deputados e senadores são julgados pelo Supremo Tribunal Federal e não pelos juízes de todos nós?

O ministro Celso de Mello lembra que o foro privilegiado para congressistas não existia, tendo sido instituído pela Constituição de 1969, imposta pela ditadura. Não é um mecanismo relevante para garantir a independência funcional do Legislativo.

Diferentemente da percepção comum, foro privilegiado não é para proteger. É para assegurar, na teoria, julgamentos imunes a pressões políticas e corporativas. Mas os recursos e o habeas corpus existem para corrigir abusos e injustiças cometidos pelos juízes locais.

A cada eleição, processos criminais se deslocam. Reportagem de "O Globo" revela que quase 40% dos parlamentares eleitos em 2014 já são investigados.

Vamos imaginar alguém suspeito de crime grave e de apuração complexa. O personagem se elege deputado estadual e o processo é remetido para o Tribunal de Justiça do Estado. A investigação caminha devagar e, quatro anos depois, ele se elege deputado federal: o processo segue para o STF. Ele é nomeado secretário estadual, o processo retorna para o Tribunal de Justiça. Ele se desincompatibiliza para disputar a eleição: o processo volta para o STF. Elege-se prefeito, o processo vai de novo para o TJ. Se renunciar, o processo é devolvido à primeira instância, onde tudo começou.

A andança é improdutiva: entram em cena novos acusadores e juízes, decisões são revistas etc.

Aparentemente, a maioria dos casos criminais dos congressistas envolvem acusações corriqueiras, como injúria, imprudência no trânsito, embriaguez ao volante. A mais alta corte do país, que tem o papel de zelar pela Constituição, não merece ser juizado de pequenas causas.

Nas grandes causas, a tendência é a fragmentação. Traumatizado pelo longo percurso do Mensalão, o STF retirou do plenário a competência para julgar parlamentares e promove o desmembramento dos processos. Ao afastar os sem mandato de sua jurisdição, cria o risco de veredictos contraditórios em torno de um mesmo fato. É estranho que corrupto e corruptor sejam julgados em instâncias distintas.

A remoção desse entulho institucional contribuiria para uma Justiça menos errante e mais eficaz, mas depende da vontade de deputados e senadores, réus em potencial.

Fonte: Folha de S Paulo 


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